O ano da profecia e as profecias ao longo do ano


I look at you all, see the love there that’s sleeping, while my guitar gently weeps.
                E se o mundo acabasse amanhã? Alguém me perguntou o que eu faria; me disse que viria; me disse que aquilo era sério, e assim seria se o mundo fosse acabar. Alguém me perguntou sobre o fim do mundo e acho que eu não respondi com a seriedade que devia. E agora, se o mundo acabasse amanhã? E se dois mil e onze anos desde que decidiram começar a contar de novo fossem tudo o que nos podia ser dado e essa era a hora de dar tchau?
                Toda a água começaria a evaporar e, quando voltasse em tempestades, viria imunda e tóxica e cheia de morte e os ciclos todos teriam um fim em espiral e nada mais sobraria de pé e seria só pedra e frio.

I look at the floor, it needs sweeping, still my guitar gently weeps.
                Eu sei o que eu faria. Se ela viesse pra assistir ao fim do mundo comigo, como se fossem os fogos de artifício que costumam bombardear os céus todo ano. Se ela viesse, meu mundo seria mundo pelo menos por um instante, entre nada e o final. Se ela viesse, eu a seguraria forte, forte, porque li que os carbonos são capazes de fazer inúmeros tipos de ligações e talvez, às portas do fim, as leis da física se voltariam para mim e talvez os nossos corações, meu e dela, se uniriam por um momento no mais literal e idílico sentido; e o meu abraço seria casa, meu carinho calor, meus olhos compreensão, minha voz conforto. E a chuva tóxica não ousaria penetrar a nossa casa.

I look at the world and I notice it’s turning while my guitar gently weeps.
                Hoje é o ultimo dia do ano. Mas é só mais um dia como outro qualquer e nem quer dizer que à meia noite o planeta vai estar exatamente no mesmo lugar que esteve a essa hora no último ano; porque alguns deles são bissextos e ainda dizem por aí que a gigantesca quantidade de nada do universo vem aumentando (ou nós, que nos julgamos tudo, vamos diminuindo, murchando depois do longínquo sopro de vida?).

I look from the wings at the play you are staging while my guitar gently weeps.
                Sensação de dever cumprido depois de mais um ano inteirinho? Mas o blog só vai fazer seu primeiro aniversário em março e só lá vou poder olhar pra trás e dizer: quanta merda eu escrevi por aqui. Porque ninguém realmente se importa, conquanto nós nos sintamos importantes.

As I’m seating here going nothing but aging, still my guitar gently weeps.
                O que falta são só os meus votos de um melhor ano. Com mais sorrisos, porque só eles fazem o mundo girar enquanto alguns lutam para congelar o núcleo, o coração.

Perspectivas e Conjecturas


                E o ano acabou. O que tinha de suceder já sucedeu e agora estamos todos nostálgicos em relação aos eventos acabados nos 365 dias que se fizeram passar nas vinte e quatro horas habituais, dispostas em diurnas e noturnas. Aquilo que no momento em que ocorreu nem parecia algo de mais, agora parece um evento digno de ser pincelado no céu. Mas o que me preocupa não são as fálicas experiências vividas neste ano que finda, mas sim as incertezas do ano que se dispõe à minha frente.
                Incertezas, ó, leitores, abstrações, por assim dizer, nebulosas. A começar pela possibilidade do blog cerrar suas portas, que me tem tirado o sono; seguida de perto pela eminência da minha saída de casa. Sim, caros leitores, pode acontecer. Faço uma pausa para explicar o porquê. Ocorre que eu prestei vestibular na Universidade Nacional de Brasília (não sei se já falei sobre isso). Foi difícil, mas tenho esperanças, veremos onde isso vai dar, mas, se tiver passado, para lá irei. Não que isso vá interromper nossas peripécias blogueiras, o blog segue normal; além disto tudo, vêm a busca por trabalho, sim, caros leitores, já estamos na idade de darmos sossego a nossos pais; fora o fim do mundo, que dizem vir nesse ano que chega.
                É, caros leitores, o ano novo não se restringe a promessas que não se vai cumprir e votos que não são sinceros, não senhores, há sempre a dúvida, principalmente na tenra idade em que se encontram estes que vos escrevem.
                O que nos espera? Ingressando na faculdade ou não, nossas vidas mudarão. Acabou-se a escola, acabou-se a infância, mesmo que nos queiramos convencer de que ela se foi faz tempo, somente agora o veredito foi dado. E ele não é de todo “bom”, como pensávamos quando tínhamos quatorze anos; ele também tem seu peso, a responsabilidade.
                Por hora, estou curtindo minhas férias. Faço conjecturas sobre o que fazer no ano novo. O legal é que qualquer ato contínuo que você fizer na virada do ano você poderá dizer que está fazendo desde o ano passado. No final, acho que vou passar com meus amigos. Deve ser o mais seguro. Nunca almejei passar réveillon em praias assistindo fogos e, como já disse antes, nunca apreciei festas. O show da virada da Globo é uma merda e não tem nenhum show local que me atrai. Logo, amigos, churrasco e um rock tocando no PC deve ser a melhor hipótese.

Pós-Zumbis 3ª temporada (5)

PARA LER OS ANTERIORES CLIQUE AQUI!
------------------------------------- 

                Choreilargado está de arma empunhada, Linda o segue de perto; ainda não saíram do cômodo.
                _ Tem gente demais lá fora. – diz Choreilargado.
                _ ¬¬.
                Linda retira a arma das mãos de Choreilargado e toma a frente. Espia o exterior discretamente. Embora a movimentação fosse grande, ninguém lhes parecia dar grande importância.
                Exatamente de frente a eles havia uma porta, estava entreaberta. Linda corre e adentra a sala. Ao empurrar a porta, esta esbarra em alguém que jazia lá dentro, era alguém que não conheciam. Este assusta-se com a repentina agressão e vira-se afoito; Linda chuta-lhe a face, fazendo o sangue lhe correr pelo nariz. Ele intenta fazer algum alarde sonoro, um grito, talvez, o que provavelmente seja a reação mais instintiva, mas Linda é impávida, aponta-lha a pistola de forma tal que nem precisou pedir que ele não fizesse nenhuma bobagem.
                Deste modo, subseguindo a cadeia de eventos, Choreilargado também corre para a sala, passa despercebido, ou ao menos é o que parece; fecha a porta atrás de si. A sala escurece. Tenteia procurando algum interruptor, ou mesmo uma alavanca, que é o que combinaria mais com aquele local grotesco, mas nada encontra.
                _ Merda. – diz Choreilargado, já sacando o isqueiro do bolso.
                O isqueiro que Choreilargado portava era destes de querosene e pavio, que uma vez aceso só se apaga ao ser fechado; gravado na lateral dele havia um revolver com uma rosa enroscada. Choreilargado acende o isqueiro e o ergue à altura do rosto. Era uma sala de armas.
                É importante fazer

Navidad

            O natal parece ser algo como uma doença hereditária e não importa o quanto você se considere desapegado e racional, de uma forma ou de outra, acaba se enchendo de comida na casa de alguma tia. Não sou daqueles pseudo-ateus neonazistas (apesar de concordar com aqueles que pensaram "e toda essa merda de terminologia repleta de prefixos pretensiosos?") que dizem odiar o natal, mas também não concordo com decorações natalinas em vias públicas, o que considero desrespeitoso com os judeus e os índios (e o que é que esse país tem feito senão ofender judeus e índios?).
            O engraçado é observar como toda essa festa virou ferramenta de chantagem e tortura psicológica para pais inseguros obrigarem seus filhos delinquentes a pararem de mijar na casa toda. E ninguém mais pensa em Jesus. Não lembro da última vez que vi minha família conservadora e mais ou menos católica, como quase absolutamente todas as outras, fez uma oração genuína em nome do Cristo operador de milagres.

(Sem) Tempos Contemporâneos:

Lembre-se ao menos de respirar...

*Na frente duma vitrine*
    Expira
    Nossa a promoção do natal já expirou Mesmo assim a roupa continua barata Talvez eu compre Mas parece que ela aperta um pouco na cintura Vou ver se posso experimentá-la Qualquer coisa a costureira arruma Ficaria ótima no Réveillon Já comprei umas seis roupas pro Réveillon mas acho que essa fica melhor Tenho que passar com estilo Vai essa mesmo Será que vou estourar o limite do cartão Meu décimo terceiro ainda não entrou A v**** da minha chefe  Lembrar que tenho que voltar a trabalhar dia 2 Dia 3 tem aniversário da tia não posso esquecer Ixi esqueci de pagar o IPTU Por que  esses impostos só aumentam A crise já num passou Deveriam reduzir essa mer**  MEU DEUS Esse sapato de salto alto vai ficar sensacional com o vestido Porém não tenho um acessório legal para o conjunto Além de ter o risco de se eu comprar ter que gastar minhas economias que estou juntando para comprar minha bolsa Victor Hugo Com quem mesmo está meu Os Miseráv-
    Inspira
    -eis NOSSA estou atrasada Será que o tanque do carro está cheio Se não tiver Por onde vou ter que passar Correr no shopping ficaria deselegante Modos e poses feminina sociais idiot**...

Natal! De presente... PODCAST!

Ian, Marco, André e o convidado especial Pedro "Nazi" gastam tempo falando d'o intrigante e curioso:
Ouçam!
[ESTE PODCAST CONTÉM SPOILERS!]
[É RECOMENDADO QUE SE ASSISTA O FILME ANTES DE OUVI-LO]



(peço compreensão pelo ligeiro ruido que será ouvido durante todo o podcast, não acontecerá novamente!)

Eu, único

                Acordamos. É manhã. O que nos motiva a sair da cama é a perspectiva de um dia cheio de bons ares e fortunas a descobrir; temos em nosso egocêntrico ego a ideia de que somos únicos, isso nos impulsiona o passo, nos dá perspectiva. Temos a ideia de que somos singulares, que temos o “algo” que nos difere dos demais agora 7 bilhões que preenchem a vastidão do mundo. Acreditamos que nossas percepções são auto-sugeridas, que nosso estilo é próprio, que nossas conclusões são diferenciadas... O que não passa de ilusão das mentes perturbadas que somos nós(es).

                O mundo exige isso, exige uniformidade. Mas as pessoas não, as pessoas exigem pluralidade, ou pelo menos a ilusão de uma.
                Enfim, o que temos são “pacotes”, temos pacotes diferentes. Dentro destes pacotes temos pessoas. Você nasce dentro ou escolhe um destes, mas são pacotes coletivos, não se dá para criar um pacote onde só caiba a sua figura. Temos os estilos tal e tal, escolha um. Este É VOCÊ.
                Esboço o mais amarelo dos sorrisos que tenho quando penso que em qualquer esquina posso trombar com meu duplicado, que no sentido original da palavra é uma atribuição errada à frase, uma vez que não somos apenas dois, muito provavelmente existem bem mais eus do que eu e mais um. Esboço meu sorriso amarelo e triste. É triste tomar conhecimento de alguns peculiares fatos ao longo da vivência neste planetinha azul, e olha que minha vivência ainda é curta. Mas no final é isso, é a barganha inevitável que o Universo faz conosco: queres respostas? Esclarecimento das dúvidas? Pagas com sua felicidade. Mas ai também há outra ressalva a se fazer. Posso dizer que, se reflete sobre o mundo de forma perspicaz e lógica e ainda consegue ser feliz, sua felicidade é bem mais genuína e honesta que a do medíocre.
                São raros aqueles que não querem o mundo nos braços, a grande maioria de nós tem planos de enriquecer com alguma ideia esplendida, talvez um lapso de iluminação advinda do próprio Deus, o que nunca é esperar demais, afinal estamos sempre esperando a mãozinha do Onipotente. Ora bolas, se pode mover montanhas com um olhar, se pode alagar a terra com chuvas, por que não corrigir alguns zeros na minha conta? Poxa vida, é algo tão simples de ser feito.
                O nosso espírito unitarista nos diz que somos únicos, que temos personalidade, que temos um sorriso cativante, talvez; que temos a faca e o queijo na mão para fazermos a mágica perdurar e sermos bem sucedidos; que o mundo é nosso quintal. Bem, estamos com um resquício de antiquadas tradições se assim for, pois ainda hoje cagamos no quintal.
                Não é piegas demais? A piada trágica do ser humano tentando tocar sua vida. Dizendo que é senhor do seu mundo, e que nele reina soberano; que sabe exatamente seu trajeto e que tem o controle da situação; que escolheu a camisa rosa por que quis; que fez Direito por que quis; que comprou a referência em computadores do ano por que quis; que montou um blog por que quis; que é o que é por que quis; que só ele é desse jeito no mundo.
                Nem nosso nome é único, seu Cadastro de Pessoa Física é mais único que seu nome. Você é mais número que nome, partindo do princípio da singularidade. A única coisa que lhe diferencia dos outros 7 bilhões é... bem, nem eu tenho uma resposta. Whatever, nunca prometi respostas, de qualquer forma. Como é que poderíamos ser únicos em um mundo que precisa produzir em larga escala, construir em larga escala, destruir em larga escala, emburrecer em larga escala. É impossível.

----------------------------------------------------
Ps: Feliz natal pra todo mundo... Amanhã tem PODCAST ESPECIAL PRA VOCêS
(mas não é sobre natal)

Amarelo


Dois girassóis se beijavam frenéticos e perdidos
Com seus miolos quentes e violentados
Na minha frente e dos meus lados
Surpresos por eu continuar ali, sem sentidos

Páginas velhas, amarelas, cansadas
Letras azuis esquecidas, jogadas às traças
Desejos que não dizem mais nada
E dizeres que não mais querem que eu faça

Mas girassóis não se beijam como estes na minha frente
E os dentes amarelados do esquecimento
Não devoram os fracassos na minha mente
Como a lua de mágoa onde me sento

E com a ferrugem persistente eu assisto
Às mãos que tocam chagas que não doem
Como a renúncia penitente de um cristo
Que com olhos viu as tristezas que destroem

E eu vejo, sempre que posso, o belo
Mas minha venda é um losango que guarda estrelas
Que brilham embaixo das sobrancelhas
E em cima de um pacato sorriso amarelo

Pós-Zumbis 3ª temporada (4)


Para ler os anteriores CLIQUE AQUI!
--------------------------------------------

Um dia propício para ligar o foda-se

_-+PRIMEIRO DIA+-_

                Tudo estava nebuloso na cabeça de Monquei, principalmente suas vistas; e não porque lhe drogaram ou bateram, mas porque tiraram-lhe o benefício dos óculos.
                Monquei estava em uma sala úmida e escura, com uma turva luz que saia das paredes para refletir no teto. Estava com as mãos amarradas acima da cabeça. Não sabia por quanto tempo estava assim. Estava quase pegando no sono quando a luz, que era algo que tendia ao amarelo, tornou-se azul, então um jato de água muito gelada caiu diretamente sobre ele. Monquei tinha razões para odiar os filhos-da-puta, mas agora sentia uma vontade real de matar. Monquei detestava mudanças bruscas de temperatura, era extremamente sensível a elas, era como se trilhões de bilhões de micro-agulhas penetrassem sua pele e fizessem um movimento de vai-e-vem; e pior era depois, os espasmos decorrentes do frio, a perda de sensibilidade nas mãos e nos pés... Monquei tinha razões para desejar sangue neste momento.
                _Olá, Sr. Monquei. – diz uma voz por um alto-falante anexo em algum lugar que Monquei não conseguia enxergar.
                _ Chupe meus bagos. – Responde Monquei, Cortesmente. Como os odiava nesse momento, estava tremendo de frio.
                _ Isso não foi muito educado, Sr. Monquei. – responde a voz, com tom de censura.
                _ Pare de me chamar de Senhor. Onde estão meus amigos? Onde está R.!? – Pergunta Monquei.
                _ Não precisa se preocupar com eles agora. Tem fome? – pergunta a voz.
                _ Vá pro inferno, bastardo. – responde Monquei. – Eu quero saber onde eles estão! ONDE ELES ESTÃO! ONDE ELA ESTÁ!
                A voz já havia desligado a conexão

Um brinde à amante frígida

            Por mais de oito anos, o governo norte americano, principalmente representado pela figura odiosa de George, deu motivos gratuitos para que nós, os poucos anti-imperialistas remanescentes, disséssemos muita, muita coisa desagradável a seu respeito. Afinal de contas, a ocupação do Iraque estava ali na nossa cara, todas as bombas e mortes também, tudo isso em nome da defesa da liberdade. Quem estava sendo libertado mesmo? E quem goza da perpétua liberdade, aquela amante frígida que ganhou estátua, quem?
            Mas, enfim, eles construíram um modelo de democracia. Eles foram um exemplo de tolerância religiosa. Sempre foram aquela benevolente figura paterna, sempre disposta a pôr ordem na casa. Ou não? Mas parece que tiveram alguns prejuízos durante os últimos anos: estão mais para um vovô obeso e decadente, mas com um monte de armas de fogo debaixo da cama.
            E então assistimos ao primeiro presidente negro dos Estados Unidos estuprar a ideia da guerra chegar ao fim para alavancar uma reeleição. Justo, válido, que eles se explodam com as suas decisões erradas.

            Já passa da hora de deixar de ser tão dependente, de se importar tanto com o que não merece atenção. Porque uma mulher matando um cachorro não é, nem de longe, tão cruel e absurdo e desumano quanto a guerra. Você maltrata os animaizinhos quando compra diversos tipos de produtos elegantíssimos, e isso importa? Você maltrata gente, gente que morre e que vive como animal, e isso importa menos do que um cachorro?

O rapaz mais triste do mundo - Caio Fernando Abreu

            Um aquário de águas sujas, a noite e a névoa da noite onde eles navegam sem me ver, peixes cegos ignorantes de seu caminho inevitável em direção um ao outro e a mim. Pleno inverno gelado, agosto e madrugada na esquina da loja funerária eles navegam entre punks, mendigos, neons, prostitutas e gemidos de sintetizador eletrônico - sons, algas, águas - soltos no espaço que separa o bar maldito das trevas do par que na cidade que não é nem será mais a de um deles. Porque as cidades, como as pessoas ocasionais e os apartamentos alugados, foram feitas para serem abandonadas - reflete, enquanto navega.
             Ele: esse homem de quase quarenta anos, começando a beber um pouco demais, não muito, só o suficiente para acender a emoção cansada, e a perder cabelo no alto da cabeça, não muito, mas o suficiente para algumas piadas patéticas. Sobre esse espaço vazio de cabelos no alto da cabeça caem as gotas de sereno, cristais de névoa, e por baixo dele acontecem certos pensamentos altos de noite, algum álcool e muita solidão. Ele acende um cigarro molhado, ele ergue a gola do impermeável cinza até as orelhas. Nesse gesto, a mão que segura o cigarro roça áspera na barba de três dias. Ele suspira, então, gelado.
             Há muitas outras coisas que se poderia dizer sobre esse homem nesta noite turva, neste bar onde agora entra, na cidade que um dia foi a dele. Mas parado aqui, no fundo do mesmo bar em que ele entra, sem passado, porque não têm passado os homens de quase quarenta anos que caminham sozinhos pelas madrugadas - todas essas coisas um tanto vagas, um tanto tolas, são tudo o que posso dizer sobre ele. Assim magro, molhado, meio curvo de magreza, frio e estranhamento. O estranhamento típico dos homens de quase quarenta anos vagando pelas noites de cidades que, por terem deixado de ser as deles, tornaram-se ainda mais desconhecidas que qualquer outra.
             O bar é igual a um longo corredor polonês. As paredes demarcadas - à direita de quem entra, mas à esquerda de onde contemplo - pelo balcão comprido e, do lado oposto, pela fila indiana de mesinhas ordinárias, fórmica imitando mármore. Nessa linha, estendida horizontal da porta de entrada até a juke-box do fundo onde estou e espio, ele se movimenta - magro, curvo, molhado - entre as pessoas enoveladas. Vestido de escuro, massa negra, monstro vomitado pelas ondas noturnas na areia suja do bar. Entre essas pessoas, embora vestido de cinza, ele parece todo branco. 

Cartilha brasileira para plantar ufania

"Agonia refletida"

Clique para ampliar



Passa um braço de vento esbarrando na aba do chapéu de palha de Aarão.
Aarão abana o ar pra tentar sacar o chapéu, mas ele vai girando além da janela do apartamento e planando nas alturas. A palha do chapéu está tonta, some através das edificações tatuadas de luz solar; o sol já se pusera bem longe, mas que ilusão de refração da lente atmosférica! Aarão observa. Espirra. Volta para 1500.
Cento e poucos anos antes de 1500, no reino de Aragão, um parlamentar escrevera um pedido num envelope de carta: gostaria de navegar até a Índia pelo trajeto oposto, porque darei uma volta na aresta quadrangular da Terra e darei comigo lá. Pôs um papel branco dentro do envelope e deu-o ao rei, que dormia na cátedra ao seu lado.
— Desde quando a Terra é quadrada? Perguntou o rei.
— Desde quando deus a fez.
— Pois não conheces a profundidade da terra a ceder-nos milho e beterraba, nem a profundidade do azul aquoso marino?
— Sim, e daí?
— Se a Terra tem fundo, não pode ser quadrada. Quadrados são planos. No mínimo, é um cubo.
 E o parlamentar montou num burro, colocou-o sobre um dos três bilhões de barcos a vela que iam junto a ele em expedição. Ouviram-se três sinais. No primeiro, todos os marujos pegaram o palito de fósforo. No segundo, todos os marujos passaram fogo no palito e, do palito, aos pavios das velinhas presas nos mastros. Sopraram o fogo, ganharam impulso, deslocaram-se. Riscos, palitos, pavios, sopros, deslocamentos. Em 1500 chegaram até Índia errada aqueles que não haviam cuspido pulmões para velejar.
Mas não chegaram do mesmo jeito que de Portugal saíram. Foi que os barcos a vela da expedição do parlamentar luso, no meio do caminho, toparam com uma embarcação grande de ferro, metálica, movida a motor, que ia à direção contrária.
— Quem são vocês? Perguntaram os índios lá em cima da embarcação de ferro. Os portugueses ouviram ruídos animalescos, pois não entendiam linguagem indígena.
— Olá!
— Quem são vocês? Se não disserem agora, lançaremos tiros de canhão!
Mas nem atiraram, já que os lusitanos enfeitiçaram-nos com cacos de espelho e lantejoulas. Dominaram seus navios. Desmontaram dos burros, largaram os palitos de fósforo — que após o uso eram lançados ao mar para, feito João e Maria, lembrar-se do caminho de volta —, giraram o volante, foram para a Índia errada, cujos esporos, filhos índios, já saíam além-mar para colonizar terras novas.
1500. Matas esverdeadas chegam a níveis estratosféricos. Certa espécie de planta vai tão alta que roça a lua em ventanias, diziam os pajés, civilizando os portugueses. Todos estão em roda numa reunião da tribo e as crianças de cabelos lisos em cuia dançam a dança da chuva. As caboclas pretas mostram as coisas todas, sem nenhuma vergonha, porque ninguém ali foi tosco bastante para comer maçã. Aliás, maçã não dá em trópicos.
Na metade da noite, há o ponto alto do festim: o sacrifício dos escravos. Vai andando ritmada uma fila de moços pretos, saindo da porta da oca maior, e, no que aparece um homem branco na metade da fila, grita um português:
— Um branco! Lá! Libertem o branco!
O branco deixa a fila a rodo de risos, vermelho de risos.
— Meu nome é Aarão. Por favor, levem-me com vocês, não aguento mais esta vida pacata de coleta de peixes e frutas, de flechas, de pinturas corporais, de lutas nuas entre homens... No que me deu de espirrar em meu apartamento na cidade grande, vim parar nestas terras. Sou do futuro, juro. Não pertenço a esta idade.
Aarão chora.
— Aarão, tu és um de nós.
— Que alívio, meu bom Jesus, vou-me embora, então?
Aarão já vai tirando a penugem colorida dos colares, já vai limpando a maquiagem pesada de urucum. Os lusitanos estão muitíssimo felizes, lambem os lábios, babam.
— Aarão, vem conosco, entre naquela caldeira de água quente e logo tudo estará resolvido. Os portugueses o deixam de molho na água, que começa a ferver. Os índios, ao perceberem a mentira do ato, tratam de salvar o prisioneiro branco da caldeira, pois a legislação da época já extinguira há tempos o que os lusos estavam para fazer: o canibalismo. E outra vez os europeus têm de ouvir do bê-á-bá indígena, mas ainda não aprendem. Nunca vão.

"Escrevo para Compreender"


                Mentira das mais fajutas é dizer-se que se escreve sobre aquilo que se sabe. Disparate. Pelo menos para mim. Falo justamente daquilo que não sei. “É como se, para entender, precisasse tentar explicar a outra pessoa.” Talvez este humilde blog tenha me salvo a vida, afinal, aonde iria despejar tanta amargura? Nem o mais benevolente dos amigos aguentaria tanto.
                Como disse Douglas Adams: “Escrevo de forma lenta e dolorosa.” É como se estivesse a extrair minhas vísceras enquanto as colo em um quadro cubista. E embora isso pareça masoquista, posso dizer que me viciei. Tornei-me adicto da escrita. É quase instantâneo abrir o Word à primeira ideia formulada. Talvez por isso eu tenha medo, tenha medo que daqui seis meses o Machado perca seu fio e não consiga mais rachar cabeças. (se não sabe do que falo CLIQUE AQUI).
                Já escrevi sobre diversas coisas, e nenhuma de minhas dúvidas foi sanada até hoje, mas vício que é vício não pode trazer respostas. É como o bêbado que sempre tenta achar a resposta no fundo de um copo que sempre está cheio. Saramago disse certa vez: “A literatura não serve para nada.” E este é um dos exemplos raros das “Mais sábias frases dos quarenta volumes da história universal”. Sim, serve para quê a literatura? Lê-se um livro extremamente filosófico, pomposo e crítico. Sua visão do mundo se abre, supostamente percebe o Erro do mundo, és um dos novos donos da verdade. E então perguntam, “e que é que isso mudou na sua vida?” E não se tem a resposta. Não se tem por que. Mesmo conhecendo a “verdade do mundo” você continua tendo medo do seu patrão, continua comprando roupas em shoppings e continua colocando a culpa da corrupção nos políticos.
                Eu tenho me empenhado no que diz respeito a multiplicar esta coisa que não serve para nada. Não tenho pretensões exorbitantes. É verdade que sou prepotente em relação a meus textos, mas não os vejo difundidos e glorificados na interwebs. A verdade é essa. Eu faço esta pergunta a vocês, caros leitores. Vocês vêm até esta bagaça, lêem nossos textos pseudo-intelectuais... Isso fez diferença real na vida de vocês? Isso faz diferença real na vida de vocês? Vocês mudaram de atitudes por algo que leram aqui?
                Quando não há nada a dizer o melhor é calar. Por isso calo meus dedos cansados e deixo-lhes com este testículo mixuruca que escrevi.
-------------------------------------------------
Ps: Peço desculpas pela ausência do Pós-zumbis ontem e pelo atraso do post hoje. Ocorre que caiu um raio nas proximidades da minha casa, consequentemente, uma série de equipamentos eletrônicos, inclusive meu modem de internet, foram comprometidos, quarta feira que vem, para compensar, terá episódio duplo de pós-zumbis.

Filhos da Guerra Fria

    Já no final da década de 1980, ficara evidente que o Capitalismo imperaria no mundo, e esse estava cada vez mais forte devido ao desenvolvimento (da 3ª revolução industrial) que obteve durante o período da Guerra Fria ( como já previsto por Legião Urbana em casos como esse, explicitado em sua música A Canção Do Senhor da Guerra ["Uma guerra sempre avança a tecnologia / mesmo sendo guerra santa, quente, morna ou fria (...)"] ).
    A tecnologia fruto deste desenvolvimento fez gerar como produto algo que afetaria, permanentemente, as futuras gerações: a internet.
    Como muitas das coisas utilizadas por nós, a internet também foi criada para princípios bélicos inicialmente, em que seria um modo eficiente de comunicação entre bases subterrâneas caso houvesse uma guerra nuclear, além de poder salvar informações essenciais, sobre tudo, em bancos de dados (subterrâneos), sem precisar reservar quilômetros e mais quilômetros para papeis (livros, fotos/ imagens, arquivos,...).
    Mas por melhor que seja qualquer invenção, a humanidade sempre consegue lhe atribuir um lado negativo.
    Já no início do século XXI, um quarto da população mundial já possui internet em casa, com esse número percentual quase crescendo em proporções de progressão geométrica (assustador!), trazendo vários lados positivos, que você leitor já deve ter pelo menos uma noção mínima, já que está a ler esta postagem. Porém para contra-balancear a equação da matrix, há uma compensação negativa.
    Dos inúmeros pontos ruins, como hackers (crakers), vírus, alienação, falência de enciclopédias impressas (Barsa v.s. Wikipédia —> Wikipédia won!), fácil e rápida propagação do funk (...), vou focar hoje naquilo que aparentava ser uma coisa boa da internet: a informação.
    Não estou dizendo que a livre e rápida circulação de informação propagada seja ruim e sim que ela tem um lado ruim (um pouco inesperado até). Comecemos pelo lado bom:
    Além do básico, dentre as quais tal tipo de informação situa as pessoas sobre as coisas do mundo, dando  a elas a oportunidade de reagirem contra ou afavor, além de ajudar a formar pensamento...
    Temos do lado bom, como incentivado pelo famoso grupo hacker, inspirados no filme V de Vingança (muito bom!), Anonymous, as pessoas estão virando fontes diretas, publicando os acontecimentos de acordo com o que elas estão presenciando, ou seja, fatos (de uma guerra, por exemplo) sem censura ou manipulação da mídia [como aconteceu na Primavera Árabe]. O grupo Wikileaks também, incentivador da causa, tem contribuindo expondo a corrupção de governos, denunciando atos imorais de governos contra os direitos humanos, entre outras coicitas mais.
    Mas tanta informação fez surgir (como já dito) algo inesperado: uma síndrome da informação (ou síndrome do excesso de informação).
    Nas palavras de Gilberto Dimenstein, "[...]O excesso de informação já produziu até mesmo a versão 2001 dos hipocondríacos: são os cybercondríacos que passam a apresentar sintomas imaginários. Quem tem a síndrome não consegue dormir: não quer perder tempo e quer continuar consumindo informações. As pessoas com quadro agudo dessa síndrome são assoladas por um sentimento constante de obsolescência, a sensação de que estão se tornando inúteis, imprestáveis, ultrapassadas.[...]".
    Mas isso é por que está acontecendo mais coisas no mundo ou simplesmente por que está mais fácil a divulgação de informação?
    Enfim, parece que o mundo está girando mais rápido e alguns não estão aguentando tanta informação e isso está pifando alguns. Como a vovó já dizia: Todo excesso faz mal!

    E como fica o conhecimento na sociedade da informação?

Varguismo, cristianismo e halterofilismo


                Eu tenho uma teoria de que Getúlio Vargas tinha um complexo napoleônico. Ele julgava ser Napoleão, não só por causa da pouca altura e do jeitinho cheio de si de tratar das coisas. Assim como o Rubião que foi amigo do Quincas, fritou os miolos pensando que era o francês atarracado.
                Não faz sentido? Ele se apoderou de um movimento de revolução (resguardadas as proporções, é claro, porque o Brasil nunca viu algo como a revolução francesa, imagina mandar o Figueiredo pra guilhotina antes que ele pudesse escapulir com o rabo entre as pernas), tornou-se uma figura idolatrada apesar das controvérsias e ainda se suicidou! Tocando nesse assunto, é bom ressaltar que suicídio é um termo relativo quando se trata de eventos históricos: pode se referir a alguém que se matou ou a alguém que morreu sob circunstâncias bem elaboradas.
                Afinal de contas, Jesus era judeu. A circunstância faz o ladrão e o ladrão faz a circunstância. É tudo a ação do tempo. As pessoas são melhores em corromper do que em criar.
                É como diz aquela música, a gente chegou um dia a acreditar que tudo era pra sempre, sem saber que o pra sempre sempre acaba. É só uma sucessão do nada que parece ser tudo. É só um i maiúsculo que ora parece L, ora parece 1.
                Se pareceu pessimista e chato, imagina a porra da carinha que tudo fica melhor! :D

                Merry Mary, marry me!

Pós-Zumbis 3ª temporada (3)


PARA LER OS ANTERIORES CLIQUE AQUI!
 --------------------------------------------------------
Acabou a brincadeira.

                Lá estava Fronrel, sentado em uma cadeira que se sustentava no nada. Uma imensidão, um sem-fim de nada que o cercava por todos os lados. “OLÁ!”, diz ele. Silêncio. De repente uma voz mecânica começa: “VOCÊ DEVERIA TER SIDO MAIS CUIDADOSO!”, e o “CUIDADOSO” ecoa por toda eternidade naquilo que parecia já ter sido um milhão de anos e vidas e que mesmo assim ainda parecia longe do fim. Fronrel está nu, nu como no dia em que veio ao mundo. Sente um ligeiro frio nas partes. De repente começa a tocar um funk muito alto. Escorrem lágrimas dos olhos de Fronrel, ele sempre achou aquela música torturante, quase insuportável. Então eis que surge Monquei à sua frente, todo ensanguentado. Ele começa um discurso, mas pronuncia as palavras de forma errada e com um sotaque atroz. Então aparecem todos os outros: Albinati, Choreilargado, Camaleão, R. e até mesmo Linda. Monquei termina o discurso, o Funk começa a tocar mais alto ainda, então todos eles começam a dançar no compasso da música. Fronrel tenta levantar-se da cadeira para sair correndo, mas, como foi dito, a cadeira sustentava-se no nada, e Fronrel cai, cai infinitamente, e ainda por mais tempo.
                Fronrel acorda.
                Fronrel está preso em uma cela. Uma de suas pernas está presa à grade. Seu braço dói, percebe que lhe foi aplicada uma injeção, não sabe para quê. Não consegue discernir muito bem onde está, pois, se a cela tinha luz, não estava sendo usada.
_=-- PRIMEIRO DIA --=_

Tanto que nem sei

          Ninguém sabe exatamente o que tem por trás daquele sistema de abertura das latas de coca-cola. Ninguém! Às vezes ele simplesmente falha e você se pergunta por quê?, mas a pergunta não vai bem aí, já que está na cara. As latas não se abrem às vezes porque elas são perversas e maquiavélicas, elas preveem um futuro turvo e dão um empurrãozinho. Foi no exato momento em que aquele anelzinho da lata quebrou antes de empurrar aquela parte que se abre pra baixo, fazendo com que a coca (zero ou normal, não lembro) se tornasse inalcançável, que tudo começou.
          E muitas coisas vieram depois disso.
          Porque algumas mesas permitem que duas pessoas sentem-se lado a lado e, intencionalmente ou não, toquem-se. Debaixo delas corpos se enroscam, mesmo que por poucos minutos e sem conforto algum. Mas, no universo que duas pessoas criam com as suas pernas e mãos debaixo da mesa, há um brilho e um calor que a natureza vê com bons olhos.
          As borboletas têm dois pares de asas membranosas cobertas de escamas, que apresentam formas e cores variadas, além de peças bucais adaptadas à sucção. E, nas improbabilidades da entropia universal desde os remotíssimos tempos do big bang, calhou de uma dessas mostrar-se amarela, como os raios do sol que sempre vêm, inevitavelmente vêm, felizmente vêm: tomara que venham. O engraçado é que o nome científico desse tipo de borboleta é Phoebis! Ela podia ser mais pop? Mas não sei se é certo ver tantas delas e por tanto tempo...
          Sabe, tem filmes que a gente jura de pés juntos que jamais vai pagar pra ver no cinema e ainda se compromete a semear um torrent por décadas só pra avacalhar. Um desses era a tal história de vida do nosso ex-presidente Lula. Quem, em sã consciência, passou uma tarde agradável assistindo a algo assim? Quem? Eu.
          Mas também tem quem ouça Beatles sem compromisso algum, só pra ser descolado, ou só pra curtir mesmo. Eu sei que eu não. Eles são muito pesados e eles têm mensagens subliminares. Já experimentou ouvir Baby, it’s you quinze vezes seguidas? Mas, de qualquer forma, a culpa não é deles, é minha.
          Nada muito importante? Não sei pra quem isso é nada muito importante. Eu sei também que importância é aquilo que a gente dá pras coisas que não quer que vão embora. Por isso, é importante sim.

Quando o amor vira despeito


                O que fazer? A pessoa que você diz gostar não lhe quer. Ela não te quis, e o que antes parecia amor, agora você remoe nas entranhas como o mais genuíno despeito. Não, você não quer admitir, mas é, no íntimo você sabe que é. Eis ai o perigo, ficar remoendo e remoendo os porquês. Porquê ela não te quis? Porquê ela não enxergou o amor que você sentia por ela? Porquê ela foi tão insensível? Como disse Machado; não o de Eugênio, o de Assis; o amor é mais uma questão de condições do que de pessoas. Não havia nada de errado com você, tão pouco com ela, simplesmente não aconteceu. Talvez porque naquele dia você tenha sido carinhoso demais quando ela só queria curtir o momento, talvez porque ela tenha tido problemas que não margearam em você a solução... enfim, toca a vida que, se não, daqui a pouco acaba-se o momento e você ainda está a remoer a velha dor, que já nem sabe mais porque sente nem porque ainda a remoe tanto, mas tem que remoer, tornou-se sua rotina, tornou-se seu propósito tentar entender porque não deu certo. Talvez porque, no fundo, você pense que pode fazer algo a respeito, quando na verdade não pode. A carruagem seguiu viajem. A magoa pode até ficar por um tempo, é verdade, mas nada que o tempo não sare.
                Por quê? Porquê é tão difícil para ti deixar o barco seguir? Porque, dia após dia, ainda senta-se a pensar nesse assunto a muito acabado? Porquê? Se tantas ai fora te querem, se tanto já passou, se já és homem grande o bastante para saber que castelos construídos no ar não são feitos para se morar dentro. Talvez seja porque você tenha encontrado nela um porto para um momento difícil da sua vida, ou talvez simplesmente porque a amava genuinamente; pode ocorrer, por mais improvável; mas sábio foi o vovô que disse: “quando um não quer, dois não brigam.” E ela não quis “brigar” com você, caro amigo. Ela já deve estar com outro, deve estar seguindo em frente, e você ai, com essa cara de mamão, roendo as unhas e se pondo inconformado.
                E hoje, como você se está se sentido? Sim, eu sei, triste. Poxa, caro amigo, vamos, levanta-te e anda, como disse Jésus; larga mão desta obsessão, sim, obsessão, nada mais que isso. Esquece esse tropeço e peregrina. Peregrina até achar alguém que lhe faça esquecer que um dia ela existiu. É assim que funciona, acha-se alguém que te ajuda a esquecer o erro anterior até que esta pessoa se torne o “erro” e ai peregrina de novo. É mal do Homem caminhar errante eternamente. O kA é uma roda, já dizia Roland.
                Por hoje chega, cansei de ouvir essa ladainha sua. Até mais... não, sem essa de “amo-a”. ELA NÃO TE AMA! NÃO ENTENDES-TE ISSO AINDA? Carajo! Ainda há de virar um velho, um velho arrependido, arrependido por ter perdido tanto tempo esperando o improvável, esperando por uma volta que não viria, esperando por um reconhecimento que jamais deu sinais de existência, esperando por um olhar dela que jamais teria. Chega disso, vamos que te pago uma bebida. Sim, Whisky, talvez até conheçamos outras raparigas, que tal? Sim, raparigas, não por serem promíscuas, é só o nome original para garotas.

---------------------------------------------------------------------
Ps: Em virtude do vestibular ocorrido na última segunda, pós-zumbis sai em edição mais que espexial no sábado.