Debaixo da escada, feito o Harry

— O que é você?
— Um monstro.
— Você mata?
— Não.
— Você come gente?
— Não.
— Então o que você está fazendo no meu guarda-roupa?
— Eu não estou no teu guarda-roupa.
— Onde você está?
— Na tua cabeça.
— Fazendo o quê?
— Estou fingindo estar no teu guarda-roupa para evitar que tu durmas.
— Por que eu não posso dormir? Eu estou com sono.
— Por causa do incêndio.
— Que incêndio?
— Aquele em que tu serás a única sobrevivente.
— Aqui em casa?
— Sim.
— Que dia?
— Hoje.
— Meu deus, eu tenho que acordar meus filhos.
— Eles não ouvirão.
— Por que não? Claro que vão, é só eu chamar.
— A porta está trancada. Tu não conseguirás sair.
— Impossível. Esta porta não tem fechadura.
— A porta do teu quarto não tem fechadura. Esta porta tem.
— Mas eu estou no meu quarto!
— Não estás, não.
— Onde eu estou?
— Na despensa debaixo da escada.
— Não. Eu me lembro bem de ter entrado no meu quarto, deitado em minha cama, sob minha coberta e ter desligado o abajur. Eu não posso estar no quartinho debaixo da escada.
— Todas essas coisas, sim, foram feitas. Mas as fizestes tu ontem, não nesta noite.
— Só que lá é pequeno demais e escuro demais. Eu teria percebido.
— Tu consegues enxergar agora?
— Não.
— Por quê?
— Por causa da escuridão, oras. Acabei de apagar meu abajur.
— Logo, acende-o.
— Cadê meu abajur?
— Desde quando teu abajur fica na despensa debaixo da escada?
— Quem me trouxe pra cá?
— Eu.
— Você me trouxe e depois entrou na minha cabeça...
— Sim.
—... Para me salvar de um incêndio. Não faz sentido.
— Estás certa, só faz sentido depois que descobrirem que a culpa são dos pavios das velas.
— Velas? Pare com este joguinho sujo.
— Tudo bem. Eu nem te incomodava quando começaste a interrogar-me.
— Faz bem em voltar ao silêncio.
— Então tu vais colaborar e ficar aqui, sã, até que termine o fogo de pegar em tua casa?
— Vou.                                                                                        
— Por que fizeste esta escolha?
— Não era isso o que queria? Pois tem.
— E seus filhos, não te importam?
— Eles vão se safar.
— É só por curiosidade. Vai, conta o porquê desta escolha.
— Pois que de uns segundos pra cá eu vim sentindo um cheiro de...
— Fumaça?
— Sim. Você também sente?
— Eu não tenho nariz. Meu deus esqueceu-se de fazer-me um.
— Que pena.
— Eu sei. Mas posso ver além das paredes e confirmo o que te diz o teu nariz: tem mesmo muita fumaça nos cômodos desta casa.
— Por que eu?
— Quê?
— Por que você me escolheu pra sobreviver ao incêndio? Poderia ter privado a vida dos meus filhos, coitadinhos, mas privou a minha.
— Bem, eu gosto de mentir para as pessoas. E tu caíste. Tu tens aquela carinha de gente inocente que mesmo em situações ruins não se deixa ficar histérica, então achei que seria mais fácil.
— Você mentiu pra mim?
— Algumas vezes.
— Isso quer dizer que você não é um monstro?
— Não. Eu sou mesmo um monstro.
— Quer dizer que eu não serei a única a sobreviver ao incêndio?
— Bingo!
— Que bom que tudo vai ficar bem e ninguém vai morrer.
— Este não é o ponto.
— Então o ponto é que eu serei a única a morrer?
— Sim, este é o ponto.
— Por quê?
— A resposta é fácil: tu estás presa debaixo da escada, num espaço pequeno e sem ventilação. O ar tem de acabar uma hora ou outra, não é? Não deves ser tão egoísta, a atmosfera não é só tua.
— Você quem me trouxe aqui, eu não tenho culpa nenhuma!
— Claro que tens. Foi por tua causa que eles acenderam as velas.
— Oh, meu deus, é verdade: foi ontem à noite que eu fui para o quarto e deitei na cama e apaguei o abajur. Hoje foi meu aniversário!
— Que bom que retornas a tua consciência. Dali a pouco, tu retornarás ao pó que nunca deveria ter deixado de ser.
—...
— Não fiques triste, é esta a ordem da coisa. Tu nasces, tu morres, tu nasces, tu morres.
— Acho que vou ficar histérica.
— Isso não vai acontecer, menina.
— Ao menos você sabe ser gentil.
— Em que sentido?
— Ah, você sabe, eu não sou assim tão menina como eu costumava ser.
— Sério? Engraçado, está tão escuro aqui que nem posso ver teu rosto. E tua voz me parece tão melodiosa que pensei que tu fosses uma mocinha!
— Quem me dera ser uma mocinha. Esses tempos já se foram. Hoje mesmo eu completei oitenta e três anos.
— Só não lhe desejarei felicidades porque falta pouco para que tu morras.
— Desgraça! Eu não queria morrer.
— Se não quisesses morrer, deverias ter apagado as malditas velas.
— Espere um pouco, eu já sei de que velas você está falando. São as velas do bolo, não são?
— Um bolo muito saboroso, por sinal.
— São ou não são?
— Sim. São aquelas malditas velas do bolo, as oitenta e três. Uma hora tu terias de bater as botas. Mas para já com este choro estridente! Para, que agora nem mais uma menina te pareces, e sim um neném chorão.
—...
— Tem de entender que qualquer que fosse o pretexto, incêndio ou afogamento, não importa, já é tempo!
—...
— Veja só o que temos aqui: uma menina forte e saudável. Já escolheu o nome dela, senhora? Toma, toma, pode segurar sua filha.

Colóquio com você ai

Olá, leitores.
Se não me falham os atributos memoriais, esta é a primeira vez que escrevo uma espécie de carta, para a qual gostaria de resposta, afinal, um colóquio só o é se houver ao menos um par, se não teríamos de trocar o "co" por "soli".
Vim por duas razões: A primeira é estar, desde ontem, a tentar escrever algo que eu considere tolerável para aqui publicar. Um esforço grande, somente equiparado ao seu monumental fracasso. Saiu pouco, e o que saiu não foi satisfatório. De modo tal que chego agora, por volta do meio-dia de hoje, sem algo competentemente escrito. Mas bem;

A segunda razão é a de que estarmos há certo tempo como andando em um pântano, sem galochas e sem lanternas. Não temos recebido significativos comentários que nos indicassem um norte: "Escrevam mais artigos de opinião"; "escrevam mais contos"; "mais poesias"; "não entendi aquilo"; "achei o tema bom"; "achei supérfluo"; "vocês são uma chatice, parem de escrever, pelo amor de Deus!".
Nada, nada de nada.

Entendemos como válida a premissa de que só se deve comentar aquilo que se tem interesse em comentar, e não estamos, também, pedindo que fiquem ai se desgastando tentando invetar algo interessante para partilhar. Não, partilha-se quando a isto o cerne chama, e quando a consciência apetece atender aos anseios do cerne.

Enfim, gostaria de saber o que têm achado do blog, sinceras opiniões, tanto acerca dos temas, quando em relação a o que seria interessante fazer de diferente.

E esta, em particular: Gostaria de saber o que vocês acham de uma nova série...

É isso ai, não se esqueçam que amanhã eu e meu grande amigo Vinicius (que não participa deste blog) estaremos fazendo um pequeno show no CAFUNÉ bar&cozinha.

Apareçam por la:
Show no CAFUNÉ BAR E RESTAURANTE
Av.T-63,Qd.08,Lt.01-St.anhanguera-Goiânia/GO
A PARTIR DAS NOVE Horas DA NOITE!
Se clicar a imagem cresce

O Homem Contemporâneo


Só me interessa o excesso
As coisas fúteis da vida
Maldita
Mal tida esta vida
Amarga e gorda,
Suja e cega
Que vela as portas de comércio
Como igrejas e trata o próximo
E o outro como ou pior que o nada

Não me interesso pelo humano
Só por marcas e comerciais
Letais como injeções que me entorpecem
E me fazem sentir a quem do mundo
Vivo em um riso profundo

E que profunda é a minha existência
E que bendita é esta droga
Que me faz melhor que toda esta corja
De gente com quem sou obrigado a conviver
Com esta horda fétida que não conseguiu vencer

Eu tenho carros do ano
E camisas de corte italiano
E quando chego nos lugares, me recaem olhares
E as pessoas me cumprimentam diferente
Como se eu fosse onipotente

Eu sou melhor que toda esta gente
Não lhe importam os meus modos e sim o meu dinheiro
Que interessa a procedência
O que importa é a conveniência
Daí glórias à minha carteira

Todos se curvam perante mim, mesmo as leis, mesmo os reis
Porque eu tenho dinheiro e me afundo em vinténs
O Meu rosto é uma grande nota de cem

Nem se lembram do meu nome, mas sabem quem sou
E como vou, todos querem ser iguais a mim, querem esnobar
Querem humilhar, destratar, tripudiar.
Querem ser da alta classe que sorri e diz que o mundo tem feito grandes progressos

Station 1: Hydra

The polar bear
     Semanalmente Globo Repórter, Fantástico e outros vários programas televisivos mostravam as catástrofes do aquecimento global. O calor das chamas do inferno consumindo a Terra e provocando o aquecimento global ampliado milhares de vezes pelos gases que liberamos na atmosfera, sendo o principal o CO2. Vestibulares e redações inteiras só sobre o assunto.
      We all deserve to die! ...And all of us will die! Inclusive os seus fofos sangrentos ursos polares! Pois o mundo está acabando! As geleira estão derretendo! O planeta está aquecendo! Os ursos polares estão ficando sem chão! Pânico! Era claro e óbvio. E então... NADA!
       Mas o que aconteceu? Simplesmente todos ligaram o foda-se? Baixou um espírito de Sweeney Todd no povo e "deixem que todos morram"? A Terra não estava aquecendo?
         O fato é que depois do drama todo e depois de alarmar, literalmente, o mundo inteiro, chegaram uns cientistas e falaram "Para com esta porra aí! A história não é bem assim não.". Logo de cara as universidades (redações) abandonaram o tema, pois não gostam de tratar sobre temas duvidosos... Dai prosseguiram: Esta história de aquecimento global provocado pelo homem é pegadinha dos países ricos. Podem ficar sussa.
       Desde de então nunca mais se tocou no assunto. E já que a humanidade precisava de um novo acontecimento apocalíptico veio a historinha dos Maias.
       Fim!

       Em suma foi isso, mas o que esses tais cientistas pesquisaram afinal?
       De acordo com eles o drama do aquecimento global é uma farsa alimentada pelas grandes corporações dos países ricos que queriam impedir a concorrência dos novos empreendedores através do medo e de forma que estes não tenham um grande rendimento produtivo, ou que tenha grandes gastos, para controlar a taxa de dióxido de carbono liberada na atmosfera.
        A Terra está sim aquecendo, mas de acordo com eles, isso já aconteceu antes, assim como o outro extremo [as eras do gelo], e com quantidades de carbonos totalmente variadas (ou seja, a Terra já aqueceu com bem menos CO2 na atmosfera), logo eles concluíram que não é o CO2 o responsável pelo o aquecimento do planeta, o que está acontecendo é algo normal e aconteceria com ou sem a presença do homem.
       Mas com ou sem a interferência do homem, a migração por impactos ambientais já começou. Vários povos habitantes de ilhas no Pacífico (principalmente as próximas da Austrália) tiveram que serem evacuados, pois o local iria submergir devido a elevação do nível do mar, como a ilha de Tuvalu.

       Em minha opinião de merda, logicamente vou concordar, tanto porque faz sentido e outros tantos confirmaram sua teoria, ainda mais com fosseis de gelo (uma análise feita perfurando o gelo... quanto mais profundo mais antigo, e assim eles determinam uma variedade de coisas sobre os anos passados da Terra). Mas mesmo assim creio eu que o homem não é o único e nem (de longe) o principal responsável pelo aquecimento global, mas eu ainda sim acredito que foi a gente que acelerou tal processo (pelas emissões de CO2 etc.).

       E os ursos polares o que fazemos com eles?
       Só espero não encontrá-los no deserto da Tunísia!

O Sexo


                Em demasia estimado, demasiado incompreendido. Àqueles que recatados se postam, é motivo de corar as maçãs do rosto, àqueles mais libertinos é leitmotiv para longas conversas e chacotas, muitas vezes mentirosas e interesseiras.
                Sexo, das coisas mais bonitas que a vida tem, talvez seja, paradoxalmente, uma das mais feias; digo no Homem, claro está, basta filmar a si e a outra fazendo para saber. Dois corpos desengonçados a cavalgarem-se, a transpirar, a lamber, a morder, a gemer. É, ponto para os recatados. Mas é também uma das sensações mais indescritíveis, talvez o contato mundano mais próximo do divino. É exercício que contrai os músculos para relaxar o cerne.
                Sexo. Existem aqueles que o fazem por “esporte”, existem aqueles que fazem por amor. E os dois tem sua beleza, mas talvez a segunda modalidade ganhe em elevação espiritual, enquanto a primeira se limite aos anseios da carne. Ambos têm seus momentos, mas poderia eu dizer que um é evolução do outro, e nem preciso especificar a ordem.
                O sexo, ato condenado, ato cobiçado. Sublime e profano. Existem aqueles que só o fazem de luzes apagadas, para que não se contemple um e outro a vergonha do par, que pode estar tanto nas expressões do rosto quanto nas formas do corpo. E existem aqueles que só se satisfazem se estiverem a ver em plena composição a outra metade.
                Sexo, ato que um de tal deus deu para que “nos multiplicássemos”, e hoje lho usamos para multiplicar os sorrisos e os prazeres muito mais que para multiplicarmos gente.
                Sexo, eu tenho o meu, ela tem o dela, e usamo-los para fazer um sexo só.
                Sexo, alguns não veem nada de mais em falar sobre, outros acham absurdo e impróprio.
                Sexo, até as baratas fazem, e mesmo assim não vemos nada de mais em fazê-lo. Claro está que temos razões diferentes para.
                Ainda um assunto místico na sociedade, ainda um motivo de ostentação, seja pelo par com quem faz, seja pelos dotes naturais que tem, seja pelas experiências que já guarda na memória. Por algum motivo alguns parecem ter mais interesse em contar o que fizeram durante o sexo do fazer o sexo propriamente, mas são males do homem, perdoemo-nos a nós mesmos.
                Sexo. Por mais que se faça, não se enjoa.
                Sexo, cordas que a natureza usa para nos puxar. Libido, vontade, ela te pega pelo sexo, torce e direciona como um leme: Aponta aonde ir, aponta aonde colocar. Pobre de nós homens, que por um x de hormônios somos guiados, mas sortudos também, porque assim tudo se dá de maneira mais fácil.
                Sexo, ainda hoje assunto em muitos lugares proibido. Nem sei por que, para ser honesto. Existem diversos momentos que se dão entre duas pessoas, o sexo é mais um deles. Todos têm sexo, todos nascem com um, uma grande maioria anseia por usá-lo seja com quem for. Uma grande maioria lho usa. Uma grande maioria lho faz. Não entendo tamanho medo ao falar disso. Não entendo tamanha ofensa em falar de um ato que tanto tem a oferecer ao homem. O sexo é das terapias mais eficientes, acalma os ânimos, equilibra o stress, relaxa e faz suar. E dá prazer.
                (se você não tiver síndrome pós-coito).

Quem, dentre amigos, tão amigo para estar no caixão comigo?


Meu menino, vem cá, senta aqui do meu lado e conta tudo o que tem na sua cabeça. Sei que você anda apaixonado e que as cordas do seu violão já não funcionam mais, mas me conta os detalhes das suas coisas pra eu me esquecer das minhas, que são ruins demais da conta. Vai, diz como é que a Camila está, aliás, eu não tenho visto aquela criatura desde o ano novo, quando nós nos beijamos embaixo dos cachos de fogos de artifício, bem no fim do coro da contagem regressiva... E não tenho me apegado a ninguém mais desde então, não só por causa das feridas que crescem ao redor da tatuagem de coração que fiz no peito para substituir o órgão que me veio faltando desde o nascimento, mas também porque não tenho vontade. É, a idade chega, acho que está na hora de me aposentar dessas aventuras românticas. Já sobrevivi até os dezessete anos, não brinco mais com isso! Sabe, eu tenho saudade do dia em que você foi lá em casa e sentamos no sofá e era domingo, passava o Faustão e mais um monte de merda, só que a gente não queria ver o documentário da Cultura que mostrava a vida animal, então abri um livro de poema e lemos tudo em voz alta, depois ouvimos Smells like teen spirit no último volume até que o vizinho começou a reclamar, mas nem entendemos o motivo, já que estávamos ouvindo no fone de ouvido do meu mp3 e rimos sem parar... Tenho saudade desse dia porque foi a última vez que a gente se viu, você nunca mais mandou mensagem, meu celular vive apitando pelos cantos empoeirados da minha casa e eu nem corro mais até ele parar ver se a mensagem é sua, porque eu sei que é alguma coisa da operadora de telefonia.
Meu menino, se sua cara não fosse tão parecida com a minha, eu não diria que eu estou conversando com meu reflexo do espelho do armarinho do banheiro.  

O Estado Laico


                E se formos assistir uma votação na câmara dos vereadores, deputados; federais ou estaduais; ou no senado, nos depararemos com a mesma figura: Uma cruz enorme de madeira ao fundo da cadeira dos presidentes de sessão, com um grande cristo fixado nela. E se pegarmos em uma das notas de circulam como moeda corrente em nosso país, teremos em um dos cantos inferiores a frase: “Deus seja louvado”. E se olharmos na história brasileira, veremos que o Brasil é declarado estado laico desde a formação da república federativa do Brasil, com igualdade de direitos entre toda e qualquer manifestação de credo religioso como prevê a constituição de 1891.
                Um evento que tem intermitentemente ocorrido no poder legislativo me traz alguns parágrafos deste texto, as ações da bancada evangélica.
                Pegarei o caso mais drástico para exemplificar, o aborto. A bancada evangélica se põe veementemente contra a legalização do aborto, mas em sua grande maioria; como qualquer um que assiste a TV SENADO pôde perceber; não o fazem por terem em mãos um estudo sociocultural e socioeconômico. Colocam-se contra o aborto por este ser contra as “leis de Deus”, a “moral” e os “bons costumes da família”. Não duvido que possa ser, eles podem estar certos, e se o estado é laico eles têm todo direito de manifestar seu credo. Mas se crer em Deus é uma questão de Fé, se aderir às renúncias que a bíblia prega é uma questão de livre-arbítrio, então porque legislar para isso? Para quê obstaculizar um projeto de lei se este não obriga ninguém a abortar? Se eles apenas permite, e com grandes ressalvas, o aborto? Eles têm medo de uma revelia por parte dos fiéis? Se uma pessoa é realmente convicta de sua fé, não é o aborto ser permitido que vai fazê-la mudar de ideia. Veja o caso do álcool, bebidas alcoólicas são permitidas, mas existe uma grande quantidade de evangélicos que não bebem justamente por crerem que não devem. Mas é aqui que quero chegar: Se o estado é laico, porque é que eu tenho de me sujeitar a uma doutrina religiosa que está a tentar se impor por meio da lei? É um absurdo dos maiores, mas quando se fala de política e religião, esperar que absurdo seja um exceção é ser ingênuo. Porque é, se a minha descrença e a crença deles têm o mesmo valor, que eu não posso ter o DIREITO de desobedecer a Bíblia? Eu é que vá me entender com Deus, não cabe a eles o poder de julgue.
                Enfim, você não vê uma imagem do exu caveira atrás de um presidente de sessão. Mas... espere um pouco: A legislação não abarca os seguidores do candomblé também? “Sim, abarca”. E ela abarca os cristãos também? “Sim, abarca”. E ela abarca os dois igualmente? “Sim, diz que ambos têm iguais direitos e iguais deveres”. E porque é então que temos Deus(falo do Deus cristão) e cristo escritos e reproduzidos em quase todos os órgãos e símbolos estatais e não temos o exu ou a pomba gira? Silêncio.
                Estado laico pra valer é absolutamente improvável, devemos isso a anos de cristianismo e a muito dinheiro que certas frentes religiosas têm. A verdade é que democracia genuína não existe de fato, não haver estado laico é só um desdobramento disso. Entenda, não concordar com a igreja cristã; que é a majoritária; é não concordar com os valores cristãos, e não concordar com estes é ser pessoa de má índole, de má conduta, um desviado. Veja só, eu não creio em Deus, mas acho os ensinamentos de cristo e determinadas atitudes deste (como acabar com uma feira na frente do tempo – leia este meu texto aqui) fascinantes, eu concordo com grande parte dos valores cristãos, mas não preciso me dizer católico ou protestante para isso. Eu não preciso ficar dando dinheiro para padres ou pastores e aceitar um livro com tantos absurdos como a bíblia para ser bom.
                “A Igreja não está interessada nas almas, estão interessada nos corpos, nos corpos e seus apetites, nos corpos e seus anseios”. Saramago disse esta frase em uma de suas polêmicas entrevistas, e ela reflete bem o que eu penso acerca das instituições religiosas: essas que têm horário na televisão, que fazem espetáculo com seus cultos, que fazem merchandising em pleno horário de culto e que descaradamente exploram seus fieis, isso tem um nome: chama-se Indústria. A igreja segue a mesma lógica, e eu já disse isso em outros textos: Você cria uma necessidade no público, faz essa necessidade tornar-se status ou algo indispensável no concernente à pressão social, argumenta no intuito de mostrar que o seu produto é melhor que os demais e cria meios de torná-lo atrativo. É o que a coca-cola faz, o Mc Donald’s, a Honda, as Igrejas, etc. Fazem.
                Igrejas, vocês não são a verdade, são interpretações. Nunca me opus a nenhum tipo de credo religioso. Existem aqueles que precisam da religião, existem aqueles que acreditam nelas, não os desmereço, só não sou um deles. Só clamo por um favor, àqueles que acreditam: Deem uma olhada no que a sua igreja faz antes de terem a pretensão de sair normatizando como as pessoas ao seu redor devem ser ou como o estado deve se portar, principalmente com outros crentes de religiões minoritárias. Lembre-se que, TALVEZ, você seja da religião que é apenas porque seus familiares o são, ou porque esta é a religião predominante em seu estado Nação. TALVEZ, se você tivesse nascido na Índia seria hinduísta, não um monoteísta. E se você quiser debater algum destes temas, os comentários estão ai embaixo pra essas coisas.

Because you have to be asleep to believe it!



O que deveria nortear nossa vida e nossos comportamentos na verdade? A evolução, o progresso, o desenvolvimento da economia, o melhoramento genético, a tecnologia dos confortos, a busca de fontes de energia renovável ou de conexões de internet ultrarrápidas?

Há quem escolha um destes, há quem queira todos e há aqueles que, num surto de megalomania, quererão outros mais. Mas é isso realmente o propósito de estarmos aqui?

A improbabilidade da existência da vida confere uma importância tão grande a ela, um valor tão imensurável, que parece atestado de estupidez gastá-la com coisas tão vãs.

Veja bem, não me excluo aqui dessas frivolidades.  Também sou vão, também sou estúpido, mas faço discursos para que as outras pessoas não perpetuem a desgraça da humanidade.

Escutem o que o genial e falecido George Carlin tem a dizer na tentativa de abrir um bocados suas mentes:


"...they want your fuckin' retirement money, they want it BACK! So they can give it to their criminal friends on Wall Street..."

Movie backwards

. Se vcs assistirem Paixão de Cristo de trás pra frente, o filme conta a história de um bando de fanáticos religiosos que pegam um cara morto, colocam numa cruz e revivem ele num ritual sangrento. Então esse zumbi começa a falar com pessoas boas, contaminá-las com doenças horríveis, transforma vinho em água, deixa um cara cego e transforma as pessoas em pagãos materialistas.

. Se vc assistir Cloverfield de trás pra frente, o filme conta a história de um monstro criado pelas forças armadas dos EUA que anda por aí consertando a cidade, construindo prédios, etc. Então o mostro resolve dar um mergulho, o pessoal faz uma festa e vai dormir.

. Se vc assistir O Exterminador do Futuro 2 ao contrário, o filme conta a história de uma poça de metal derretido que dá origem a dois robôs. Então esses robôs vivem reconstruindo um ao outro para que eles possam ficar pelados e voltarem para o futuro.

. Se vc assistir o filme Alien ao contrário, é sobre um monstro que diminui de tamanho e acaba entrando na barriga de um homem enquanto acalma a tripulação.

. Se vc assistir Sexta Feira 13 ao contrário, é sobre um cara legal que cura aleijados com uma serra elétrica para que eles possam acampar no verão.

. Se vc assistir Tubarão ao contrário, é sobre um tubarão que vomita várias pessoas até que elas decidam se reunir em uma praia.

. Se vc assistir Scarface ao contrário, é sobre um cara que larga o vício de cocaína e larga a vida do crime para seguir seu sonho de virar um trabalhador honesto e conseguir dinheiro para visitar Cuba.

. Se vc assistir Super Size Me ao contrário, é sobre um cara que vomita McDonalds durante um mês até perder 20kg e ficar saudável.

. Se vc assistir Karatê Kid ao contrário, é sobre um campeão de karatê que depois de um duro treinamento consegue virar um zero à esquerda e vai pra Jersey.

. Se vc assistir Torres Gêmeas ao contrário, é sobre um prédio que se ergue do chão para que um monte de gente suba para construir dois aviões.

. Se vc assistir Homem Aranha ao contrário, é sobre um cara numa fantasia que solta criminosos em Nova York, porém ele perde sua namorada e resolve virar um nerd excluído. Então um dia, ele é picado por uma aranha, que tira seus poderes.

. Se voce assistir titanic, é sobre pessoas que surgem da água, construem duas metades de um navio, que se juntam para quebrar um iceberg e ir para a terra.

‎. Se você assistir Inseption de trás para frente, é praticamente o mesmo filme.

. Se você assistir 127 Horas de trás para frente, é sobre uma linda história de um cara procurando seu braço no deserto.

. Se você assistir os filmes do Rocky de trás para frente, é sobre um lutador que descobre a fonte da juventude através de porradas na cara.

. Se você assistir O Senhor dos Anéis de trás para frente, é sobre um anão que acha um anel maneiro num vulcão gasta o resto dos filmes caminhando para casa.

. Se você assistir Uma Linda Mulher de trás para frente, é sobre Richard Gere transformando Julia Roberts em uma prostituta.

. Se você assistir O Resgate do Soldado Ryan de trás para frente, é sobre um bando de soldados que atravessam a Europa para ir à praia.

. Se você assistir Crepúsculo de trás para frente, o filme continua uma merda!

. Se você assistir Superman de trás para frente, é sobre um cara que voa colocando as pessoas em situações de perigo e depois se esconde.

Pijamas de greve lavados e passados



É direito constitucionalmente garantido aos trabalhadores, todos eles, greve.

De que outra forma poderiam estes enfrentar o poder dos detentores dos meios de produção, exploradores da mais valia? Porque, não se enganem, os patrões têm tudo nas mãos: a mídia, a polícia, os vigilantes, os sabotadores, os formadores de opinião e os executores, e, o mais importante de todos, o capital.

Só através da união e da organização é que os trabalhadores podem alcançar a evolução, seja ela a melhoria de condições de trabalho, de salário ou de simples reconhecimento. Mas existe uma máquina, um sistema montado para sustentar uma economia que se baseia na exploração: garantem-se os baixos preços não com um processo de produção barato, e sim com o menor gasto possível com a mão de obra. Um sujeito sozinho não é nada nesse sistema, não passa de um número pequeno, dispensável. A máquina só pode ser abalada por multidões. E não se considerem fracos e inofensivos por isso, nós derrubamos uma ditadura de militares muito bem armados e preparados pra matar!

Tudo isso acima consta para introduzir um assunto do qual meus caros leitores talvez não saibam muito: a greve das universidades federais brasileiras. Por seus respectivos motivos, as redes de informação parecem evitar falar disso e, se falam, é num tom que tenta conferir tanta irrelevância à notícia que, convenhamos, merecia muito mais destaque do que os assassinatos do “dono da Yoki” e da “irmã da mulher da fazenda”.

Depois de assembleias conturbadíssimas, onde professores entregaram-se aos calores da discussão, foi decidida através de plebiscito nessa quarta feira (13/06) greve geral dos professores da UFG a partir do dia dezoito desse mesmo mês. E isso foi apenas os campi de Goiânia acompanhando uma decisão previamente tomada pelas outras instituições do estado. E escandalizem-se: vocês podem não saber, mas quase a totalidade das Federais do país estão em greve, tornando a UFG uma das últimas a aderir. Os alunos da universidade, através do DCE recentemente eleito, optaram por apoiar a greve dos docentes e trazer próprias reivindicações. Outro fato interessante é que os Técnico-administrativos já estão em greve também.

A educação superior do país está parada. Os professores exigem mais estímulo ao plano de carreira, subsídio à pesquisa, melhores instalações, aumentos salariais;  os alunos, por sua vez, melhor infraestrutura, mais investimento na educação em si, mais verbas dedicadas às instituições, professores e administradores mais capacitados e etc.

Se a educação para, o mundo devia parar. Mas, como sabemos em detalhes, não é bem assim que acontece no Brasil...

Eu tinha um cachorro chamado Condor e ele morreu


O cachorro já não tinha mais por que acreditar em carpe diem, então deu mais um suspiro profundo e saiu da comodidade quentinha que era seu monte de trapos para afinal atravessar o vão da grade do portão. Seu dono pensava ser coisa de verme a razão de ele estar tão magricela, não vem comendo ultimamente, doutor, nem toucinho e nem filé, dizia. Mas aquilo era cisma de cão, que, aliás, é como cisma de gente: ele queria perder as banhas do quadril que o impediam de chegar à rua.
 Da rua, ouvia os outros cachorros profetizarem uma vagabundagem livre, enquanto o baraço de ferro apertava sua goela e deixava um rastro de rouquidão em seu uivo das noites de lua cheia; uma lua que o telhado e as barras de ferro não deixavam ver nem um quinto, mas já era um pedaço branco com tamanho suficiente para atiçar seus instintos de lobisomem. Da casa, ouvia o ir e vir de seus donos, via o lumiar da televisão que ainda não transmitia em cor, tampouco transmitiria quando chegasse a tecnologia, porque ainda assim sua visão carregava o destino monocromático de cachorro. Vivia naquele pedaço de caminho entre a casa e rua, numa transição que nunca chegava ao destino. As portas da casa se fechavam para sua sujeira canina e a porta da rua se fechava para sua inocência doméstica.
O lado de lá da grade o atraía, mas o portão não se abria sem que o dono desse um danado de um pontapé nas suas costelas quando tentava escapar pelos lados. Portanto emagreceu e num domingo qualquer, um domingo sem sorriso de amigo, cruzou as barras paralelas do portão, pisando pela primeira vez no mundo de fora que na verdade era o zoológico dos homens.
Foi andando pela calçada com o rabo apontando para o céu. Sua casa ainda podia ser vista da sombra da mangueira onde deitou-se, mas não podia andar mais. Dentro dele cresce um tumor, senhor, não é verme, não, dissera o doutor. E, no quintal, o dono vira seu bicho se debater contra a coisa abominável do outro lado do umbigo dele. O uivar que reagia à lua cheia passara a ficar mais e mais rouco. O rabo murchara; só apontou para o céu mais uma vez na vida. Perturbara-se o olhar carente e lacrimoso de quem quer um cafuné. O cachorro ia morrendo, mas não morreria na frente de sua senhoria. Pois ultrapassou o vão da grade e foi dar no pé-de-manga que vemos daqui da casa. De repente, expirou, a dor passou, mas el condor no pasa más. 

Mais-valia Fantasma


                Confesso que tenho cada vez mais medo de dormir e acordar acorrentado, como um escravo. Até que ponto vamos para ganhar dinheiro?
                Refiro-me a um caso recente e específico, mas que me desperta calafrios pela espinha, que é essa nova jogada faraônica no music bussines, os hologramas.
                Salvo engano, a primeira apresentação feita em holografia computadorizada com um cantor morto foi a do rapper 2Pac; agora degringolaram, querem trazer do limbo: Freedie Mercury, Elvis Presley, Jimmy Hendrix, Jim Morrison e outros mais... Não sossegam nem quando o artista já está morto? Já não basta o absurdo de ficar lançando álbuns póstumos? Estes que vêm muitas vezes com músicas que não foram lançadas JUSTAMENTE por que o artista não achou que deveria. Onde isso tem fim? A exploração em busca de mais e mais somas financeira não tem um basta? Somos tão inescrupulosos assim? Contentemo-nos, eles estão mortos, deixaram um grande legado, grandes músicas, escutemo-las, mas pagar horrores para ver um fantasma no palco, uma marionete que NUNCA vai conseguir se equiparar a quem quer representar, uma DUBLAGEM que foi feita com um único propósito, encher de dinheiro os bolsos de empresários, isso não, isso é muito. Queriam fazer tal disparate também com os integrantes expirados d’Os Beatles, mas uma pessoa em sã consciência vetou a possibilidade. A viúva do guitarrista GeorgeHarrison refutou a possibilidade.
                Ir a um show destes é, além de um desrespeito com o artista, também é uma enganação. Um holograma irá dublar uma voz gravada e, além disso, é uma ilusão óptica que não tem nada a oferecer, é completamente conformada por um roteiro, não é nada além de uma enganação comprada por aqueles que até lá forem, nada além de um caldo requentado.
                Qual é o sentido disso? E eu nem sou um “respeitador dos mortos” ortodoxo, mas creio que existem limites quando se trata de explorar um obra deixada por um grande ícone.
                  Não apoiemos este tipo de exploração hedionda.
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Ps: Os links apontados no texto são para notícias detalhadas acerca das intenções holográficas para com os artistas.

O Vocábulo


                Eis ai a dificuldade que norteia o sucesso dos textos muitas vezes escritos, e falo principalmente dos nossos. Não digo que sou um primor em erudição ou no que concerne ao lúdico, mas sinto algo quase fetichista pelo prolixo, pelos sinônimos de pouco uso, pelas palavras aristocráticas, pelo que dizem culto. Naturalmente que há equívocos, e sempre estes existirão; e há também misturas, talvez iniciando-se no lúdico, atravessando o coloquial e terminando em um belo “puta que pariu”, mas não consigo emular outra forma de escrita, se escrevesse de outra forma, não escreveria o que escrevo.
                E é justamente ai que se encontra o meu dilema. Para além dos temas, será que o que faz estes textos terem um nicho tão pequeno são os termos prolixos e as orações loquazes? Ou são somente os temas escolhidos que não apetecem a grande plateia? Será que estão concatenadas as escolhas vocabulares às inabaláveis estatísticas de acesso deste blog?
                Admito que haja ai, também, um problema de gestão, não somos grandes gestores. Ou melhor, até seriamos, se não fossemos tão francos, simples e preguiçosos. Mas talvez, mesmo que o Eike Batista se propusesse a nos gestar, ainda sim a coisa não chegasse ao mainstream.
                Não estou desmerecendo em momento algum os leitores que nos acompanham, por eles tenho grande estima e respeito e me esforço para não perder sequer um deles (até porque perder um já seria um desfalque enorme).
                Acho que para além do que já foi dito, talvez a maior parte das pessoas não se interessem por nós por não xingarmos tanto as pessoas famosas ou quase não falarmos tão efusivamente que a culpa da desgraça humana é o sertanejo universitário e o funk. Olhemos à sociedade e veremos, em grande medida, aqueles que engolem tudo e aqueles que acham que estão certos por dizerem que o que é majoritário é uma bosta. Mas o que vemos menos são aqueles que fazem uma reflexão quase desprovida de preconceitos, uma reflexão menos partidária e mais epistemológica, e não quero aqui dizer que sou um destes, não ouso tal pretensão.
                Mas, enfim, creio que me desviei por caminhos que fugiram à reflexão original.
               Sabendo-se que nunca a falha decorre de um único motivo, falo deste caso, qual é a causa maior? Má gestão? Temas pouco atrativos? Ou vocabulários demasiado mumificados? Aquele copo de Whisky? O coração que se recusa a bater no último instante? A ferida Mal curada? A dor já envelhecida? O câncer já espalhado?
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                Ps: Algumas destas indagações finais são um trecho da música "Canto Para a Minha Morte", de Raul Seixas.

Amor, como se fosse fácil


Amor é repetido, banal, alienado; é das classes rasas, dos obtusos, das desesperadas. Amor acaba assim, sem ver, e começa antes da meia noite, antes da puberdade, antes do filme terminar. Amor é de mentira quase sempre, mas nem por isso perde a credibilidade. Amor é hiperbólico, pleonástico, irônico e de transitividade duvidosa. Amor é vocabulário chulo na boca de maria e eloquência rebuscada na de hipócrates.

Amor dos outros cansa, dá fadiga de ver, causa algo que a gente não admite ser inveja. Amor de todos os tipos deveria ser tratado na primeira pessoa (do plural, veja bem): os pronomes os verbos os gemidos nossos. Amor é anagrama notável, já que mora em roma um ramo do meu amor.

Amor enche a barriga, sim, quando se satisfaz, e os pulmões quando se grita e os olhos quando se contempla e as mãos quando se acaricia. Amor mata a sede e cura a malária, pavimenta as estradas e rega as plantas. Amor é causa mortis, modus operandi e et caetera. Amor é mulher nova, bonita e carinhosa. Amor é pusilânime, é herói, é proletário e aristocrata.

Amor é roteiro barato, é título de produção de baixo orçamento. Amor é zoomórfico, antropofágico, necrofílico e pseudocelomado. Amor é proposta de campanha, é defesa de réu confesso. Amor é o fim do mundo, é o big bang, começo do universo. Amor sussurra o tempo todo e só berra de vez em quando.

Amor é aquela pessoa sobre quem mais fofocam na família. Amor tem graus de parentesco dos mais variados. Amor não aparece na previsão do tempo, só no boletim médico e no obituário. Amor explora, navega, encontra, trafica, exaure. Amor põe pra dormir e cobre de madrugada, faz leite quente e download de filmes melodramáticos.

Amor é ouvir john lennon completamente sozinho, assistir moulin rouge, ler caio fernando de abreu.

Amor às vezes nem cabe numa palavra tão pequenininha assim: amor, como se fosse fácil.

Smoke underwater - 2

...
     A festa caminhava bem, na bera da piscina, sob a lua cheia, com ótima música, excelente carne, bebidas variadas e com risadas levemente  até que alguém empolgado resolve soltar fogo de artifício e acaba incendiando a casa do vizinho acidentalmente. Chamas surgiram, se expandiram e se espalharam numa velocidade surpreendente. Saía tanta fumaça da casa que no reflexo da piscina parecia até sair da própria água tal imagem. Novamente aquela mesma situação da manhã. Smoke underwater. Fire in the sky. Resolve então mergulhar atrás. Ohhh Barracuda!
     Dessa vez a água adquiria uma densidade diferente. Era a mesma água salgada de antes, mas diferente. Upside down. Um redemoinho então surgiu e o puxou mais para baixo, foi quando percebeu que no meio de águas agitadas seu centro é calmo e seco. De repente estava em um local calmo e seco, seco o suficiente para perceber que ali não chovia a meses.
     Em meio ao desespero que lhe abateu de forma inexplicável começou a correr até não saber mais se estava molhado pela água, suor ou lágrimas, e foi isso que o fez pensar "qual a diferença entre aquela água marítima de antes com outro fluido corpóreo qualquer? o que lhe da a certeza de que aquilo não seria um mar de lágrimas?"
     Esse pensamento não foi adiante, pois naquele momento achara no horizonte aquele mesmo caballu de sua manhã, mas com uma diferença, quando este o viu, fez uma afeição sorridente.

     — Que bom que você voltou! — Pronunciou o mamíferanfíbio ungulado hipomorfo silvestre.
     — Mas achei que você me queria expulso daqui. — Indagou o homo sapiens.
     — Era a única maneira de saber se você realmente pertencia ou não a este lugar. Ninguém pode te expulsar, apenas você mesmo.
     — E que lugar é este mesmo?
     — Naquele onde você aprende a diferença entre a felicidade do saber e a felicidade da ignorância sem negligenciar nenhum deles e saber conviver com ambos... Para isso começaremos por contar mentiras para mostrar a verdade.
     — Isso é tudo meio confuso para mim, poderia me esclarecer um pouco melhor as coisas antes de começar sei-lá-o-que que você iria iniciar? Como poderei saber que posso confiar em você?
     — Qual serei a graça se pudesse... e não se preocupe, ao longo do "tempo" as coisas se esclarecerão, apenas lembre se daquele momento de sua infância em que você pensava ser possível alguma coisa e tentava com uma fé incondicional, sem nenhum medo de tentar, sem nem mesmo pensar muito naquilo, já que nem muito conhecia as leis que regiam aquele universo. É sobre o poder que o humano possuí em seu genes, mas que se torna inacessível a medida que se corrompia. O acesso aquilo que chamas de paranormalidade, que de normal tem de sobra, porém não muito comum, pois, claro, não tens tempo.
     — Como aquelas meditações que pessoas ficam anos paradas sem comer ou beber nada e sobrevivem?
     — E vivem! Sim, de certa forma também!
     — Posso só antes voltar para minha casa e pegar meus óculos de leitura?
     — Claro que pode.
     — E como faço para acordar?
     — Isso não é um sonho para ficar acordando, basta lembrar se que está com pressa de fazer algo, estar atrasado para alguma coisa e ter a sensação de que deixou a porta destrancada. Falar nisso, você lembrou de desligar a luz antes de trancar a porta? Você trancou a port- [?]

     Luz ao céu! Eletromagnética. Fótons. Onda. Partícula. Aquecimento. Reflexão. Refração. Difração. Absorção. Iluminação!
     Claros raios do sol nascente vindos do oeste...

Solenes Arrependimentos


                Creio que uma das maiores mentiras que se ouve no cotidiano da convivência é a expressão “só me arrependo daquilo que não fiz”. Provoca-me simultaneamente o riso e a perturbação. Fico na dúvida de saber se quem profere tal frase de fato crê nela, ou se simplesmente se engana em um orgulho atávico que lha impede de assumir uma das maiores consequências do humano, o erro. O erro, fatal, inerente, intermitente, concatenado ao Homem.
                Pobre iludido, em minha opinião, aquele que profere conscientemente tamanho absurdo. Frase orgulhosa, leitmotiv (intrínseco, claro está, pois é a ideia da frase e não a frase em si) da perpetuação dos erros e dos diversos relacionamentos, tanto amizades quanto amores, rompidos. O engraçado é abdicarmos de tal pensamento nos momentos em que nos é conveniente apenas. Ocasionalmente, quando admitimos equívocos, em grande parte não o fazemos por de fato termos refletido e estarmos intencionados em evolução, mas sim para atenuarmos alguma punição ou eximirmo-nos de culpa, ou seja, tentamos atenuar o erro, não deixar de fazê-lo. Queremos apenas que ele seja visto de forma mais branda, não queremos eliminá-lo. Assumimos o erro para poder continuar a cometê-lo, e conscientemente na grande parte dos casos, livremente. A premissa do “errar é humano” descaracteriza-se em liberdade para que possamos cometer atrocidades diversas.
                Se errar é humano, como diz a célebre frase, crer que não erramos, e que por isso não nos arrependemos de nada que fizemos, é nos dizermos não humanos. Mas se errar é humano, devemos nós também, por obrigação, não admitirmos o nosso erro de forma tão branda, como se o costume do perdão fosse um coringa toda vez pronto a erguer-se para nos eximir da culpa. Não devemos aqui começar a erguer o dedo inquisitório na cara do vizinho dizendo VOCÊ ERROU! Mas devemos FRANCAMENTE e COM DISPOSIÇÃO PARA REVISÃO, rever nossos atos maculados.
                Talvez a conclusão que se chegue é que, em grande parte dos casos, quem profere “só me arrependo daquilo que não fiz” sabe perfeitamente que errou, mas está tão acostumado a se eximir da culpa pela premissa do erro como humano, mesmo que inconscientemente, que já não se arrepende de ter errado, mesmo que o erro tenha sido grave, mesmo que tenha lhe custado algo ou alguém.
                E os leitores, que acham?
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Ps: Gostaria de deixar meus mais felizes cumprimentos ao nosso redator, Alisson! Pelo seu aniversário! (08/06)
Parabéns! Que muitos sigam este! 

O complexo da solitude e o Homem Vitruviano II


O peixe boiava morto no aquário redondo da mesinha, quando ela acordou toda molhada, o pijama e a cabeleira armada, pensando ter mijado uma caixa d’água inteira.
Sentou-se. Tateou a parede e apertou o interruptor que deu início ao jogo elétrico do sopro na sequência de dominós em pé: uma cadeia que não acabou com um último dominó deitado, mas com uma lâmpada acesa, claro. Após a dor que a luz repentina deu naqueles olhos rosados, viu o quarto inundado, um mar em quatro paredes cujas algas, corais e navios naufragados foram trocados por livros, quadros, meias sem pares e o restante da mobília. E antes que pudesse correr por sobre a cama para chegar até o extremo oposto do quarto, onde havia uma porta fechada, a água já havia alcançado seu pescoço, porque subia vertiginosamente rápida.
No outro cômodo, dormia um cachorro peludo. Talvez ele sonhasse no exato segundo em que sua narina foi inspirar o que pensava ser ar, mas era a água que explodira de repente a porta do quarto ao lado. Morreu enquanto a água foi adentrando a casa na forma de uma onda em cuja crista surfava frustrantemente a moça de olhos rosados.
A onda circulou a mesa de jantar, levantou o sofá, ultrapassou umbrais, deu com a porta da frente, quebrou-a, venceu o muro de dois metros, crescia, foi parar na rua e, em segundos, a cidade boiava num dilúvio embaixo de um céu azul, sem nuvem. A merda toda era que não existia um deus naquele lugar que tivesse mandado a menina construir com antecedência um barquinho de lego.
Assim que as árvores mais altas da rua começaram a ficar submersas, surgiram uns braços nadando entre as marolas e borbulhas em volta da menina cujas íris cor-de-rosa eram só parte da fantasia branca que seu par de genes recessivos para cor de pele havia imposto desde o colapso dos gametas. Albina. Sua carapaça branca ainda tingia-se do branco do protetor solar, acortinada pelos cabelos que combinavam com o de sua avó. Carregava a expressão da face feminina da Monalisa: aquele ar extraterrestre dos rostos sem sobrancelhas. Carregava também um caderninho de capa preta com seus poemas e seus desenhos proibidos.
Os desenhos proibidos agora se desfazem enquanto o papel derrete embaixo do mundo aquático. Eram tudo um só: mil cópias do Homem Vitruviano que a albina enxergava ao ver o corpo do rapaz se alongando na beira da piscina em dias de natação. Mesmo que ela sequer soubesse o nome do rapaz, pelo mesmo motivo que não sabemos o nome dela, havia paixão e gozo na simples transcrição da anatomia do nadador. Isso porque, incansavelmente, os olhos rosados dela tinham que percorrer os pequenos detalhes dele enquanto provocava o fetiche em conter a vontade de gritar: seu lindo, olha pra mim, bem aqui, esse ponto branco na arquibancada! Mas a arquibancada era branca, então ela estaria camuflada, assim como estava todas as vezes em que ele tinha a hipótese de notá-la ao seu lado, com os olhos crescidos atrás das lentes da lupa que usava para desenhar mais perfeitamente os círculos psicodélicos que eram as digitais dele.
Talvez essa ignorância fosse só paranoia, pois no dilúvio cujo nível crescia e cresceu até que aquele aguaceiro cruzou todo cerrado e fez foz no Atlântico, surgiram uns braços nadando entre as marolas e borbulhas em volta da albina. Braços que de longe ela identificou como pertencentes ao Homem Vitruviano, não esticados entre a perfeição dos vértices de um quadrado sobrepondo um círculo, mas nadando apenas. Braços que se achegaram e pararam os movimentos natatórios. Por um breve instante, os dois boiaram frente-a-frente, ninguém disse palavra, nem as palavras inaudíveis que só os olhares fazem, por causa do balanço frenético das ondas e do rufar incessante das asas dos albatrozes. Mas, de repente, ele levantou aqueles braços e pôs as mãos sobre aqueles olhos rosados que, aliás, eram a torneira pela qual saía a torrente de água.
Acontece que, na noite anterior, a albina fora dormir pensando no quanto queria tocar, cheirar, brincar com os cinco sentidos e todas as frutas da salada mista junto ao nadador. E deixara a torneira tão aberta que na horinha em que o nadador interrompeu a torrente com as mãos, seu organismo que, assim como o meu e o teu, seria 70% composto de água era uma enrugada uva-passa, seca, pequena e, finalmente, não mais branca: vermelha. Vermelha pelo sangue comprimido e de vergonha, afinal sentia o toque das impressões digitais que já havia mapeado há muito tempo.
Quem diria, ela se ruborizou mais ainda quando o nadador tirou as mãos dos olhos rosados e lá pôs o sebo de seus próprios lábios para enfim as lágrimas coagularem.

Ultraviolento


                A história escrita por Anthony Burgess é considerada por alguns como integrante do chamado “tripé das distopias literárias”, ao lado de Admirável mundo novo e 1984. Realmente enquadra-se nesse ramo, mesmo sem o apelo para mirabolantes desenvolvimentos tecnológicos, e sim para o extremo das ações humanas. O enredo caracteriza-se como uma deveras profunda crítica à sociedade e, atemporalmente, ao ser humano.

                Indivíduos que se entregam às drogas, à música pop massificada, à violência e à discriminação declarada das minorias; governos maquiavélicos, mentirosos e conspiratórios; sistemas públicos falhos e corruptos: onde está o limite entre a ficção e a realidade?

                Nós somos aquilo, mas ainda tentamos nos esconder da verdade. Segundo Renato Russo, “nos deram espelhos e vimos um mundo doente”. Ainda num diálogo intertextual, é como no texto dos ‘Nacirema’: espantamo-nos com as barbaridades, até que percebemos quão bárbaros somos.

                Outro ponto interessante é a Técnica Ludovico. O sistema carcerário, incapaz de reformar os cidadãos descumpridores da lei, aliado ao governo, interessado em obter resultados manipuláveis para angariar prestígio político, lançam mão de um método de lavagem cerebral que tornasse o sujeito incapaz de cometer atos criminosos. De um lado, o governo e os mais radicalistas consideram interessante a aplicação de tal procedimento visando à diminuição dos níveis de violência, de outro, a oposição e a igreja – essa preocupada por perder os preciosos pecadores e redimidos, aquela participando o corriqueiro jogo político – alegam a perda do livre arbítrio e a crueldade empregada.

Alex torna-se uma mera cobaia, joguete na mão das facções políticas. Um homem que tinha tudo o que queria enquanto vivia no crime e perde tudo e é rejeitado quando “reabilitado”. A família e os amigos o abandonam, só lhe restam aqueles com interesses mesquinhos.

 Não sei ao certo qual a intenção aí contida, mas talvez a ideia seja de que a ciência ainda não é capaz de controlar completamente o homem.

Cyber Vida


                Estamos na era da computadorização, de modo tal que já não nos damos com a remota possibilidade de viver sem determinadas ferramentas da atualidade. Sou completamente a favor das novas tecnologias, do avanço propiciado à medicina e tudo mais que esta onda tem como efeito, porém, como tudo no homem, é o destempero, a ausência da justa medida que me causa medo.
                A força-motriz deste post foi minha tomada de conhecimento de um produto que a Google vem desenvolvendo. Chama-se: Google Glass. Trata-se de um óculos de realidade aumentada, ou seja, trará integração direta de diversos serviços diretamente nos seus olhos: Serviços de mensagem, videoconferência, informe das horas, temperatura do ambiente, GPS, serviço de compras, agenda, câmera, dentre outros serviços. Tudo isso diretamente interligado a você, e a ferramenta é administrada por controle de voz.
                Naturalmente que se trata de uma ferramenta revolucionária, algo que trará agilidade e comodidade (ainda mais) à vida humana. E naturalmente que tem pontos extremamente vantajosos, mas será que estamos no caminho certo? Será que tudo tem de ser assim tão automático? Há, por exemplo, uma cena no vídeo demonstrativo do produto (ao final do post) em que o sujeito entra em uma loja (o vídeo é em primeira pessoa) e, ao entrar, pergunta ao óculos, “onde está a sessão musical?”. Realmente precisamos deste nível de urgência? De não poder nem mais se dar ao prazer de ir percorrendo uma livraria em busca do que se quer? Mas nem é esse o grande dilema que este adereço me fez refletir, a questão, para mim, é: Onde isso para? É fácil, o óculos é removível, no momento em que quisermos, o tiramos do rosto e já está, mas e quando começarmos a embutir tais mecanismos irreversivelmente em nosso corpo? E não sou um destes saudosistas antitecnológicos, muito pelo contrário, sou um grande entusiasma das novas tecnologias, só creio que talvez o homem esteja embevecido demais com tais artigos para se lembrar de coisas mais humanas. Não quero soar conspiratório, mas tenho medo de uma possível época em que as máquinas sejam um adereço indispensável até mesmo nas mais simples interações humanas. A nossa necessidade pelo prático nos tem feito cada vez mais esquecer que o comum, que o natural, que o artesanal também tem sua beleza, também tem seu valor.
                Fato é que ainda subiremos muito nesta escada, mas deveríamos refletir mais sobre as relações humanas neste sentido, no “onde” o convívio indispensável com as máquinas está nos levando.
                Well, confesso agora que, ao reler o texto, não sei se ele ficou muito claro, mas era só uma espécie de medo reprimido. O que vocês acham, leitores?

Video demonstrativo das funções do Google Glass: