Lord, why? Where were you? Did you know what happened? Do you care?
~
A árvore da vida ~
À noite sempre
acordo, olho os origamis pendurados no teto e eles olham para mim, pego o
celular em cima da mesa, vejo as horas, volto a dormir. Esta noite não foi
diferente, a não ser pelo fato de que quando ela se foi ninguém mais levantou senão
eu. Naquela manhã comum, os postes desligaram suas lâmpadas, um após o outro,
tinha cheiro de café pronto, mas não havia mais ninguém para acordar. Saltei da
porta de casa para o mundo e pressenti pela solidez da ausência de ruído que
estava sozinho. A Terra rodava silenciosa. Meu grito de susto, não pelo
fantasma que teria visto, mas pelo vivo que não vi, foi engolido pelo silêncio
de uma humanidade desaparecida.
Esteja aqui,
agora.
Voltei para o
quarto, voltei para a cama gelada onde havia meus três travesseiros que abracei
como se fosse meu alguém amado que a vida me priva de conhecer. O cheiro de
café ainda existia. Quem o teria feito? Pulei do colchão, as colchas planando
sobre o chão, meus pés escorregando até a cozinha e o que vi foi só o umbral da
porta por onde passei e a fumaça vazando pela chaminé do bule.
Me abrace.
Brother.
Keep us. Guide us. To the end of time.
Havia eu, havia
minha sombra esguia: tudo corria sobre a rua vazia da cidade vazia e dentro de
mim a vida concentrada queria se espalhar, explodir, porque era esse o sentido
da difusão: o mais concentrado tende a passar ao menos concentrado. E nisso, a
pele formigando, os pensamentos sendo puxados a todo canto da rosa dos ventos,
a vontade atômica de meus minipedaços por ocuparem o meio hipotônico, a
gravidade parou de agir ante tantas forças e comecei a voar.
Me deixe ser a
causa de seu banzo lacrimal.
Brother.
Mother. It was they who led me to your door.
Quando a gente
voa, a coluna dói, eu não sabia, como poderia? Lá em cima eu estava sozinho
como estava em baixo como estava para sempre e percebi que me faltavam vírgulas
em todas as vezes que disse que amava e nunca me disseram de volta, porque hoje
acordei sozinho, como ontem, como sempre. Então meu drama foi diminuindo, fui
caindo na desgraça da banalização do pronome reflexivo, fui murchando no céu ao
lado do prédio mais bonito da cidade, que era cheio de espelhos ao invés de
paredes. Murchei feito balão, as forças que sugavam minha vida mantendo
equilíbrio com os pontinhos pretos que brotavam no asfalto, que eram as pessoas
voltando do lugar onde tinham sido escondidas.
Beije meus
olhos, deve ser bom. Segure minha mão. Pose seu rosto para eu desenhá-lo num
poema.
Help
each other. Love everyone. Every leaf. Every ray of light. Forgive.
De repente,
estava de volta no chão de uma calçada com gente à beça. Eles me ignoravam,
enquanto eu procurava aquela que tomaria o lugar dos três travesseiros. Num
segundo então a vi. Não sei como se parecia, como era a casca, mas vi uma coisa
brilhante, argentina, bonita e bonita para mim, bem no fundo de seu olhar. Eu
quis dizer alguma palavra, não, podia ser qualquer ruído, eu queria estar com
as mãos mergulhadas na coisa do fundo do olhar.
Não me deixe
sozinho jamais. Venha, meu coração está com pressa.
Mother.
Make me good. Brave.
Pois num lapso,
eu fui. Este verbo podia me levar a dois lugares: fui me encontrar com ela e
respirar da coisa que brilhava prateada e lindamente. Ou fui-me embora. Num
universo diferente, com possibilidades diferentes, talvez o universo do outro
lado do espelho, onde há um cara parecido comigo, mas sempre mais bonito, que
talvez tenha uma vida mais agradável, neste lugar eu fui me encontrar com ela,
mas aqui... Aqui privei-me nas reticências. Aqui voltei para os três
travesseiros, para um tipo de relógio biológico que me acorda no meio da noite
só para olhar as horas no celular e verificar se os origamis continuam estáticos
lá em cima, pois se estiverem se mexendo foi porque o anjo com quem estava me
abraçando na ilusão da maciez de meus travesseiros teve de fugir às pressas na
iminência de meus olhos abrirem-se subitamente.
Naquela noite,
os origamis estavam parados, mas uma pena caía devagar, planando, de lá para
cá, até pousar sobre minha bochecha.
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