Acabou-se a pilha dos lábios, ou: Os ocos ecos da minha voz


                Contemplo o meio; nada me prende a atenção, nada me desperta vontade de me esforçar. Nada parece ter sabor. Ouço uma melancólica música, sinto a mais profunda tristeza, talvez nem mesmo o jovem Werther tenha sentido igual. Mas sou incapaz de chorar, não verto uma única gota salgada de lágrima sequer. Há um gato se debatendo na minha garganta, tão violento que me faz pigarrear sangue... ele não desce, tampouco  sobe; desde certo tempo ele está aqui, nunca o vomitei, nunca o digeri... ele permanece.
                Teria de estudar agora, mas nem para isso tenho ânimo; até teria-lo, não fosse a inutilidade do ato; não é que não seja capaz de entender as complexas teorias, não é que não fosse capaz de palestrar sobre elas por uma centena de dias. Mas: Qual o sentido, qual a razão, para quê, exatamente?
                Tenho muitos do meu lado, diria que quase todos; todos me têm em alta conta, todos sorriem quando chego, todos confabulam comigo, mas nenhum me leva a sério, sou o tipo ideal que ninguém quer senão para um eventual apontamento ou comentário, para rirem dos absurdos que falo e saírem dizendo “que ideias engraçadas aquele tipo tem, não?”. Então para quê? Vontade mesmo eu tinha era de queimar tudo, atear fogo ao circo e sair andando.
                Sou o bobo da corte, a requerida comédia; bom ter-me à mesa, ouvir-me tratar dos dilemas universais e particulares, dos mais simples aos mais complexos; mas ninguém me escuta verdadeiramente, é apenas entreter... E o pior é ter de manter a pose neoliberal de tolerância a determinadas opiniões por própria falha minha de querer agradar a todos, não por ser compreensivo, mas apenas para continuar sendo bem visto. Quando sei que o correto seria vociferar a todos que deixassem a covardia e a mesquinhez para a puta velha e que, pelo amor de deus, parassem ao menos por um segundo para tentarem algo verdadeiro.
                O pior é saber que mesmo já tendo-me mostrado incontáveis vezes com a razão, de nada adianta, é senão acaso, nada mais. Não sou legitimado nem por uma fama estúpida para ter razão em algo, tão pouco por algum título, ou por alguma quantia de cédulas em minha carteira; nada além do argumento me legitima, e este, ultimamente, não tem bastado.
                Essa história não termina como a do Werther; não cesso minha vida em um acesso de tristeza indomável. Não posso dizer certamente como termine, mas pode ser que termine com o solver de alguns dos meus sonhos e aspirações; pois Tristeza: um dos maiores solventes das vontades nossas.

2 comentários:

  1. Se isso for um real desabafo, discordo de sua afirmação: "mas ninguém me escuta verdadeiramente, é apenas entreter..." pois não apenas o ouço, mas já fiquei a pensar no que disse.

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    1. Não foi completamente um desabafo, mas admito que algumas coisas postas, sim, inquietam-me. Agradeço o comentário e o apoio... : )

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