Aos vermes!

   Enterre os mortos, pois já não quero mais ver e nem ao menos sentir o cheiro deste que já não mais se encontra aqui.
   Deixe o apodrecer isoladamente assim como sozinho veio ao mundo de forma egoísta.
   Não deixe jamais este corpo cadavérico tocar na terra enquanto houver alguma fria carne entre as entranhas de seu esqueleto almejando assim seu retorno a natureza, pois foi ele mesmo que conscientemente em vida rompeu seus laços harmônicos com a natureza em troca de uma pouca luxuria.
   Morreu extrativista voraz de mãos limpas que preferia a natureza morta, não em um belo quadro e sim no supermercado — mais próximo de sua casa. De consciência limpa apesar de grande culpa portar, nem no purgatório merece entrar.
   Eis animal morto que não fez parte do ciclo da vida, somente como parasita.
   Ex-irmãos que ainda vivem na pouca floresta que mataram para você, ainda habitam harmonicamente em seu lar compondo a grande teia (alimentar) da vida, onde com a mesma dignidade que arrumou comida se tornou comida para que outro pudesse viver. Já você...
...apenas consumiste e na hora de morrer não pôde nem se dar ao valor para que outros sobrevivessem comendo suas proteínas ao não ser suas amigas bactérias e fungos que sempre te rondaram.
   Em tom mais claro:   O ser humano é o único que ao encontrar a foice da morte só traz tristeza. Um animal silvestre ao morrer logo é consumido por outro que assim poderá continuar a viver. A vida continua não por causa dele... sua causa*... não por você...


     Mesmo já conseguindo até sentir a respiração da morte baforando em seu rosto não-enrugado e sentindo seu futuro em um lampejo, pouco lhe resta a fazer a não ser se lamentar e procurar se consolar na única certeza da vida.
     Doces sonhos são feitos disto! E é por isso que todos procuram por algo.
O que estamos procurando?

Marilyn Manson - Sweet Dreams
     Estaríamos então procurando contrariar essa única e cruel certeza da vida numa espera da vinda de algo sobrenatural que venha dos céus e nos salve? Como saber? Se nem mesmo conseguimos perceber o que realmente aspiramos para nossa própria vida além de futilidades.

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Fúnebre morte as das Polygonias neste texto, com baixo índice de sobreviventes

2 comentários:

  1. Morte é um tema um pouco complexo, pelo menos pra mim. Sempre que tento pensar no que consiste me perco, vem aquela mistura de fim espiritual e ateísta no qual um propõe algo tão difícil e o outro prático, respectivamente. Você propôs o ateu, foi o que notei.
    Ao ler o título me lembrei instantaneamente do livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, muito bom por sinal, e ao me enveredar no conteúdo me fixou essa ideia ainda mais. Mas o que fazer para tornar essa condição mortal mais... digna?

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  2. Muito grato por sua participação Anônimo, seja lá quem for.
    Fico muito feliz ao ver que consegui fazer brotar uma pequena interrogação ao meio de tudo isto. :)

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