Das considerações sobre o tempo


                E o que te falta? Uns respondem dinheiro, outros força, a outros falta um braço ou perna; a mim falta tempo. As infinitas possibilidades, como até disse um tal de Bauman, talvez o maior infortúnio humano é justamente tê-las, pois delas nunca poderemos desfrutar em plenitude. Somos menos do que os nossos antepassados nos deixaram, tão menos que não mais aquilo que foi deixado nos serve, mas nós vivemos em prol daquilo que foi deixado, aquilo que estava já aqui muito antes de você, muito antes de mim.
                Este texto tem como estopim sintetizador uma recente atividade que tive de abandonar: a tentativa de algum espólio musical relevante. Tive de abdicar das rotinas fixas de ensaios, dos compromissos de pequenos shows em bares e até mesmo do estudo mais acurado da música, isto tudo em prol da faculdade. Ainda musico por hobbie, de alguma maneira haveria de continuar, mas sabe-se que a cicatriz aqui fica. Não estou aqui a choramingar, fiz a escolha em plena ciência de minhas prioridades, e não falo aqui de estabilidade financeira ou do quê virá a ser mais facilmente realizável, até porque, se eu fosse por essa linha de raciocínio, minha escolha seria tudo, menos teleológica. Fiz a escolha que fiz, em síntese, porque sempre quis respostas, e a música não me forneceria elas. Tive de escolher entre me dedicar plenamente aos afazeres acadêmicos ou a continuar dividido entre os vários quereres.
                E meu amor, a Lília, até questionou “mas Ian, você não é demasiado novo para abdicar tão firmemente assim de algumas aspirações?” e ela até pode estar certa, mas algumas escolhas na vida a gente tem de fazer, e a música, por mais que se fale de sua efervescência na juventude, pode ser retomada adiante, diferentemente do período acadêmico, este tenho de agarrar, pois não volta.
                A vontade, a urgência, a necessidade de tentar entender; já escrevi sobre isso aqui mesmo, esta comichão que se nos põe a roer dentro e não para até que nos sujeitemos a suas vontades. E pior ainda talvez seja saber que, mesmo tendo todo tempo do mundo, não poderei tentar entender nem um décimo daquilo tudo que tenho vontade. O que me conforta é tentar, mas plenamente notificado da finitude de minhas capacidades.
                O que me consola, e só consola, é a concepção de que, se existe impressão que se deixa na terra, certamente não são filhos, tão pouco bens, mas descobertas, feitos do cerne, trabalhos do intelecto... estes perduram as gerações e os ciclos, e os dias, e os anos.
                E então temos a certeza de que deixamos o caminho andado.

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