A Racionalidade Irracional
Eu digo muitas
vezes que o instinto serve melhor os animais do que a razão a nossa
espécie. E o instinto serve melhor os animais porque é conservador,
defende a vida. Se um animal come outro, come-o porque tem de comer,
porque tem de viver; mas quando assistimos a cenas de lutas terríveis
entre animais, o leão que persegue a gazela e que a morde e que a mata e
que a devora, parece que o nosso coração sensível dirá «que coisa tão
cruel». Não: quem se comporta com crueldade é o homem, não é o animal,
aquilo não é crueldade; o animal não tortura, é o homem que tortura.
Então o que eu critico é o comportamento do ser humano, um ser dotado de
razão, razão disciplinadora, organizadora, mantenedora da vida, que
deveria sê-lo e que não o é; o que eu critico é a facilidade com que o
ser humano se corrompe, com que se torna maligno.
Aquela ideia que temos da esperança nas crianças, nos meninos e nas meninas pequenas, a ideia de que são seres aparentemente maravilhosos, de olhares puros, relativamente a essa ideia eu digo: pois sim, é tudo muito bonito, são de facto muito simpáticos, são adoráveis, mas deixemos que cresçam para sabermos quem realmente são. E quando crescem, sabemos que infelizmente muitas dessas inocentes crianças vão modificar-se. E por culpa de quê? É a sociedade a única responsável? Há questões de ordem hereditária? O que é que se passa dentro da cabeça das pessoas para serem uma coisa e passarem a ser outra?
Uma sociedade que instituiu, como valores a perseguir, esses que nós sabemos, o lucro, o êxito, o triunfo sobre o outro e todas estas coisas, essa sociedade coloca as pessoas numa situação em que acabam por pensar (se é que o dizem e não se limitam a agir) que todos os meios são bons para se alcançar aquilo que se quer.
Falámos muito ao longo destes últimos anos (e felizmente continuamos a falar) dos direitos humanos; simplesmente deixámos de falar de uma coisa muito simples, que são os deveres humanos, que são sempre deveres em relação aos outros, sobretudo. E é essa indiferença em relação ao outro, essa espécie de desprezo do outro, que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência de uma espécie que se diz racional. Isso, de facto, não posso entender, é uma das minhas grandes angústias.
Aquela ideia que temos da esperança nas crianças, nos meninos e nas meninas pequenas, a ideia de que são seres aparentemente maravilhosos, de olhares puros, relativamente a essa ideia eu digo: pois sim, é tudo muito bonito, são de facto muito simpáticos, são adoráveis, mas deixemos que cresçam para sabermos quem realmente são. E quando crescem, sabemos que infelizmente muitas dessas inocentes crianças vão modificar-se. E por culpa de quê? É a sociedade a única responsável? Há questões de ordem hereditária? O que é que se passa dentro da cabeça das pessoas para serem uma coisa e passarem a ser outra?
Uma sociedade que instituiu, como valores a perseguir, esses que nós sabemos, o lucro, o êxito, o triunfo sobre o outro e todas estas coisas, essa sociedade coloca as pessoas numa situação em que acabam por pensar (se é que o dizem e não se limitam a agir) que todos os meios são bons para se alcançar aquilo que se quer.
Falámos muito ao longo destes últimos anos (e felizmente continuamos a falar) dos direitos humanos; simplesmente deixámos de falar de uma coisa muito simples, que são os deveres humanos, que são sempre deveres em relação aos outros, sobretudo. E é essa indiferença em relação ao outro, essa espécie de desprezo do outro, que eu me pergunto se tem algum sentido numa situação ou no quadro de existência de uma espécie que se diz racional. Isso, de facto, não posso entender, é uma das minhas grandes angústias.
Uma Democracia de Verdade
Eu acho que é
preciso continuar a acreditar na democracia, mas numa democracia que o
seja de verdade. Quando eu digo que a democracia em que vivem as actuais
sociedades deste mundo é uma falácia, não é para atacar a democracia,
longe disso. É para dizer que isto a que chamamos democracia não o é. E
que, quando o for, aperceber-nos-emos da diferença. Nós não podemos
continuar a falar de democracia no plano puramente formal. Isto é, que
existam eleições, um parlamento, leis, etc. Pode haver um funcionamento
democrático das instituições de um país, mas eu falo de um problema
muito mais importante, que é o problema do poder. E o poder, mesmo que
seja uma trivialidade dizê-lo, não está nas instituições que elegemos. O
poder está noutro lugar.
Que Humanidade é Esta?
Se o homem não for
capaz de organizar a economia mundial de forma a satisfazer as
necessidades de uma humanidade que está a morrer de fome e de tudo, que
humanidade é esta? Nós, que enchemos a boca com a palavra humanidade,
acho que ainda não chegámos a isso, não somos seres humanos. Talvez
cheguemos um dia a sê-lo, mas não somos, falta-nos mesmo muito. Temos aí
o espectáculo do mundo e é uma coisa arrepiante. Vivemos ao lado de
tudo o que é negativo como se não tivesse qualquer importância, a
banalização do horror, a banalização da violência, da morte, sobretudo
se for a morte dos outros, claro. Tanto nos faz que esteja a morrer
gente em Sarajevo, e também não devemos falar desta cidade, porque o
mundo é um imenso Sarajevo. E enquanto a consciência das pessoas não
despertar isto continuará igual. Porque muito do que se faz, faz-se para
nos manter a todos na abulia, na carência de vontade, para diminuir a
nossa capacidade de intervenção cívica.
Esse mestre é o que me instigou a peregrinar por vários ramos da mente que antes me eram ocultos e obscuros. Me sinto instigado a fazer algo de real relevância quando me deparo com dizeres tão sábios e profundos. Lendo tais reflexões é como se esse mundo superficial que me rodeia deixasse de o assim ser por alguns instantes.
ResponderExcluirEsse cara é foda! Ainda não li toda a obra que nos deixou de presente e me sinto culpado por isso, mas tenho plena convicção que sairei desse estado. Bom seria se todos tivessem disposição e capacidade de ler e entender o que essa peça genial tem a dizer.