Dia de princesa (só que em regime republicano)


Já ouviu falar desses programas de televisão onde uma pessoa (comumente uma mulher) ganha um dia de princesa? Pois bem, é disso que hoje quero falar.

A nossa sociedade cultua padrões e isso é inegável. A bem da verdade, a nossa não é única a se portar dessa maneira, padrões sempre existiram, fossem eles de aparência ou de comportamento. O que um dia foi fruto de desejo e cobiça, pode muito bem causar asco e discriminação hoje em dia (ou o contrário): as “ancas largas”, os pelos do peito, a intelectualidade...

Talvez a causa disso seja a necessidade que nós sentimos de seguir um guia de comportamento; as tendências, as etiquetas, as normas e convenções já estão ali e basta apenas respeitá-las para prosperar em meio aos seus iguais. É indiscutível que há regras a serem observadas quando se deseja fazer parte de um grupo, mas até onde o que vemos são males necessários para o “bom convívio” e não castração, tolhimento do individualismo?

Voltando ao cerne, Um dia de princesa consiste em encontrar uma mulher pobre, retirá-la da maloca em que ela vive, comprar-lhe roupas caras e da moda, afeitar seus cabelos e maquiá-la de forma idêntica às “famosas” e, de quando em vez, dar-lhe de comer num restaurante sofisticado, o que costuma resultar em situações pitorescas e inusitadas, frutos do estranhamento e do choque de realidades. Ou seja, dão um vale de um dia de duração para essa mulher marginalizada sair do seu inferno e ir ao céu. A nós, os telespectadores, sobram risadas perante a humilhação dessas pessoas. Mas é mais marcante ainda a emoção que isso causa nas participantes, que choram, agradecem a oportunidade e prometem nunca esquecer momentos tão lindos.

A televisão é lixo e, como todo saco de dejetos de um bom consumista contemporâneo, é pouco reaproveitável e escorre chorume. Vivem disso: tendências estúpidas, futilidades de humilhação. E o que mais me irrita e encabula é que as pessoas buscam isso, querem ser humilhadas e feitas de brinquedos idiotas nas mãos de outros brinquedos idiotas.

E só o que toda essa brincadeira gera é a intensificação do padrão. O que se percebe é que há dois padrões: um é aquele do qual todo o mundo faz parte e o outro é aquele de mentira, virtual, inalcançável, onde as mulheres são subnutridas, não têm espinhas e às vezes nem costelas.

Esses sujeitos merecem mesmo é um dia de cuzão. Perdoem o uso de palavra, mas, veja bem, se Saramago já a enfiou no meio da sua prosa tão poética, por que não?

3 comentários:

  1. É de fato uma situação perturbadora ver gozo das pessoas ao assistirem casos assim; nem sequer lembra, muitas vezes, do que se trata o quadro, o que querem são os momentos embaraçosos, os momentos que ponham a pessoa em constrangimento... dá medo... Já pararam para pensar no absurdo que é a franca alegria com que as pessoas assistem, por exemplo, as vídeos cassetadas?? ou mesmo este "dia de princesa"? Vale muito questionar quem é privilegiado com a famigerada política do "Politicamente Correto"; já que tirar sarro da celebridade é crime e ofensa das mais graves, mas fazer pessoas comuns se prestarem a papeis ridículos faz a felicidade geral...

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  2. Ler isso me fez lembrar de um quadro chamado "Arruma meu marido". Eles vão em busca de homens que desrespeitam completamente os padrões de beleza e tentam transformá-lo num: "omg!"
    Sempre fazem as MESMAS COISAS todos os programas. Investigam e expõe a vida da pessoa, seus hábitos mais pitorescos e bizarros, algo do tipo que jamais revelariam para outrem (e por algum motivo mostram para toda rede nacional).
    No final é sempre choros, pessoas emocionadas que se abraçam, blábláblá. É engraçado como os programas de televisão gostam de mostrar pessoas chorando. Eu pessoalmente não entendo por que os telespectadores se comovem com isso.
    Outro dia passando pela televisão deparei-me com algo absurdo e muito tosco. Um casal é convidado ao programa e ao longo do quadro eles tem como única função PASSAR CIÚMES UM NO OUTRO! QUE COISA MAIS RIDÍCULA!
    É uma disputa de quem expõe mais os defeitos do outro. Nesse em especial mostrou uma mulher reclamando que o marido fazia suas "necessidades sólidas" de porta aberta, e o pior: MOSTROU O HOMEM SENTADO NO VASO COM AS CALÇAS ABAIXADAS! Tudo isso em rede nacional, caramba.
    Onde há censo? Acabou a noção do que é viável ver num programa de auditório, é até nojento. E o mais assustador: o programa é um dos líderes de audiência.
    O que fazer?
    Como convencer as pessoas de que elas estão se emburrecendo?
    Como convencê-las de que elas não precisam passar o dia assistindo algo desse tipo?
    E o pior: será que elas realmente querem?

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  3. As pessoas tem uma grande necessidade de manter um canal comunicativo aberto a todo o instante! Um pequeno intervalo de silêncio é quase mortal, durante um dialogo, dependendo da(s) pessoa(s). Por isto as pessoas querem algo do que comentar.
    O que você acha mais fácil? Comentar do nada uma entrevista do Tom Zé ou que o peito de uma atriz famosa apareceu em rede nacional? Ou seja, as pessoas de cunho comum procuram coisas escandalosas para comentarem nos seu dia-a-dia, e para conseguirem audiência as emissoras vão se rebaixando cada vez mais seu nível para chamar a atenção do publico, para serem motivo de falação e com isto enriquecer.
    Como já expomos no blog algumas vezes, a televisão é o reflexo de sua população (dos seus telespectadores).

    Como fazer para mudar? Simples: Educação!

    Mostrarei um exemplo pessoal: Minha família sempre me educou a assistir Tv (e é assim com muitas famílias brasileiras, pois com a criança na frente da tv, elas te deixam em paz) e nunca me incentivaram a ler (na verdade meus pais reclamam e fazem tom sarcástico sobre eu ler, salvo os casos de livros para provas/vestibulares)! E por somente ter a Tv Aberta em casa eu comumente assistia estes programas e achava comum/normal (apesar de reclamar por não serem desenho-animado); por não conhecerem conteúdo melhor, as pessoas crescem querendo ver programas daquele nível (pois é agradável às vezes ver coisas que te relembram a infância - mesmo que isto aconteça a um nível inconsciente e porque ela não foi preparada quando criança a receber um programa de um nível maior...).
    Mas é somente após conseguir um certo nível critico de seleção, que você só consegue com boa escolaridade (infelizmente, muito pouca em escolas publicas) e com amizades certas, que você começa a assistir menos ou não assistir certos programas (a pessoa sem este nível crítico, continua a assistir BBB para manter aquele canal de comunicação sempre aberto...).
    Hoje, após certas repressões (in)diretas de minha família, que os acostumei com a ideia de eu ler (apesar de fazerem mal olhado para qualquer livro não-didático que eu gaste dinheiro — compre; ou quando vou a alguma biblioteca; ou vou a algum clube do livro) e não mais assistir Tv (só quando faço minhas refeições — um outro péssimo hábito que também me educaram), salve alguns poucos programas (como os da Tv Cultura, alguns da Futura e [muito] menos ainda do Multishow).

    Enfim, não creio que as emissoras vão mudar se a Maioria da população não mudar também seu gosto (a ponto de fazer vista grossa para os programas atuais e não ligar nem a televisão), pois elas precisam sobreviver também. Não que as emissoras não tenham uma parcela de culpa (eu pelo menos acredito que elas têm sim!), pois elas se aproveitam deste estado educacional da população e a manipula(e obviamente, que está sendo manipulado não sabe que está), para enriquecer ainda mais! E a única saída, ao meu ver, é educando esta população. Uma campanha duma minoria de pessoas pedindo programas melhores, ou tentando conscientizar uma grande maioria esmagadora, é facilmente ignorada.

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