"Se os homens engravidassem,
o aborto seria um sacramento..." (Florynce Kennedy, advogada e feminista
americana, revista Ms., Março 1973).
Até esse mês, a lei concernente
ao aborto vigente no Brasil definia que este só poderia ser realizado se
observada ao menos uma de duas condições: gravidez que fosse resultado de
estupro ou gravidez que oferecesse risco à vida da gestante.
No entanto, os Ministros do
Supremo Tribunal Federal votaram e aprovaram nessa semana passada a existência
de uma terceira condição que torna o aborto legal. Se for constatado em exames
pré-natais que o feto é “anencéfalo”, a mãe pode optar pelo aborto.
Aqui faz-se necessário definir
claramente o que é anencefalia. Apesar do que sugere a palavra, a anencefalia é
diagnosticada quando o feto demonstra má formação do cérebro. "A
anencefalia é um defeito congênito, que atinge o embrião por volta da quarta
semana de desenvolvimento, ou seja, numa fase muito precoce. Em função dessa
anomalia, ocorre um erro no fechamento do tubo neural, sem o desenvolvimento do
cérebro", diz o médico docente em genética na Universidade de São Paulo
(USP) e especialista em medicina fetal, Thomaz Rafael Gollop. Para ele, a
chance de sobrevida por um período prolongado é "absolutamente
inviável".
Cinquenta por cento das mortes em casos de anencefalia são provocadas
ainda na vida intrauterina. Dos que nascem com vida, 99% morrem logo após o
parto e o restante pode sobreviver por dias, ou poucos meses. "Os que
sobrevivem, conseguem fazer o movimento involuntário de engolir, respirar e
manter os batimentos cardíacos, já que essas funções são controladas pelo
tronco cerebral, a região que não é atingida pela anomalia. Alguns não precisam
do auxílio de aparelhos e chegam até a serem levados para casa, mas vivem em estado
vegetativo, sem a parte da consciência, que é de responsabilidade do
cérebro", afirma o professor de bioética da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), José Roberto Goldim.
O interessante nesse caso foi
observar a serenidade com que trataram o tema os ministros. O relator Marco
Aurélio Mello, fez uma defesa ponderada da descriminalização e o resultado foi
acentuadamente majoritário a favor do relator (seis votos a favor da
descriminalização e dois contra).
Agora, refletindo com cuidado
tudo o que implica essa decisão, o que se pode concluir? Isso é uma
demonstração de evolução do nosso país e da sua legislação (lembrando que a ONU
considera que a maior liberdade em relação ao aborto está atrelada ao
desenvolvimento da nação)? Isso pode se tornar um facilitador para a
instituição da legalização absoluta do aborto? São pertinentes as alegações de
que toda espécie de vida deve ser preservada, inclusive passageira e
inconsciente e anencefálica?
À primeira questão respondo que
sim. Denota-se avanço nos sistemas legislativos do país através dessa medida.
Se desconsiderarmos toda a enfadonha e incoerente ladainha religiosa (leia-se
CRIS TI A NIS MO), não há assassínio no aborto de anencéfalos, pelo contrário,
há preservação da vida da mulher. Porque, além dos riscos que levar essa
gravidez até o fim, o que dizer da traumática experiência de ver seu filho
morrer precocemente, fazendo leito de morte da sala de parto? Isso é, sim,
vencer machismos e conservadorismos insensíveis.
Quanto à legalização absoluta do
aborto, digo que não. Acredito que a saída correta é criar mecanismos
judiciários aos quais seja delegada a competência de julgar a possibilidade de
aborto, da mesma forma como eram tratados os casos onde havia anencefalia.
Aborto não pode se tornar “contraceptivo”, diz Ian Caetano, cientista social
graduando.
É por isso que não sou favorável à descriminalização do aborto AGORA. Quem defende a descriminalização hoje olha apenas para uma parcela da população, não para o todo. O Brasil está longe de ser um país referência no concernente à Educação Sexual. Muitas pessoas ainda não tem real dimensão dos problemas, e em locais muito pobres e com pessoas de baixa escolaridade isto ainda é agravado pela falta de perspectiva; o que tornaria o aborto uma saída muito procurada, uma vez que o costume da prevenção não é levado tão em conta, mas poder curtir despreocupado para depois ir lá só "corrigir o erro" de forma rápida e legal... Sou favorável à legalização do aborto, mas não agora, não na situação atual do país.
ResponderExcluirIsso inclui o aborto de anencéfalos?
ResponderExcluirNaturalmente que o caso dos anencéfalos é um caso à parte e não pode se valer da minha opinião aqui manifestada; para mim o principal é que o anencéfalo já é, quando muito, um natimorto; de modo que o aborto do anencéfalo é irrelevante do ponto de vista de preservação da vida uma vez que o bebê já nasce fadado a morrer e ainda trazer um grande trauma/sofrimento à mãe.
Excluir"o bebê já nasce fadado a morrer" se formos por sua lógica todos os bebês devem ser abortados, pois todo ser vivo nasce fadado a morte. Sou contra esse tipo de aborto pois a vida não é propriedade de ninguém e todos possuem direito a ela.
ExcluirQuanto ao sofrimento materno, apenas a gestante de anencéfalos pode falar disso, somos leigos e a não ser que tenham realizado pesquisas com mulheres que já passaram por essa experiência, se for o caso me corrija.
O homem não tem o direito de decidir quanto tempo outro ser pode viver. Quanto a valor humano, a única diferença de um idoso e de um recém nascido é a nutrição e a experiência. Parafrasei isso de um cara muito inteligente, mas infelizmente não me lembro de seu nome agora.
Marco, o que dizer das crianças que vivem 6 meses, um ano, ou cerca disso? E tenho uma dúvida... O grau dessa deformação é sempre o mesmo? Pode haver uma "pequena" deformidade? E se sim, as chances de vida seriam diferentes?
ResponderExcluirIan, as pessoas escolarizadas podem abortar só porque tem consciência? E o direito à vida do bebê? Descupe, não entendi D:
Abç!
Não foi isso que eu disse, o que eu disse é que a falta de conciência pode transformar o aborto em algo corriqueiro, e isto não pode vir a ser. Agora, sobre o "direito a vida": o que você define como vida? pra mim Vida só é um direito amparado quando vem acompanhado dos outros que lhe dão sustento: Direito a uma família(bem estruturada), oportunidade a uma educação de qualidade, oportunidade à alimentação, oportunidade à perspectiva e diversos outros; se direito a vida se limita simplesmente a nascer, então os que tem esse respaldo que eu citei são o que? Um bebe que nasce indesejado em um ambiente sem possibilidades é também um aborto, pois, embora vivo, limitar-se-a a sobreviver; estará vivo, mas nunca se desenvolverá no sentido pleno da palavra. E ai tem uma coisa pior nessa história, pois é uma dor lenta, é um martírio quase medieval, um sadismo que passa maquiado aos olhos do povo, é a privação a quase todas as "boas" chances da vida.
ExcluirVocê citou "O DIREITO À VIDA DO BEBÊ": você então não é a favor do aborto em casos de estupro, correto? Uma vez que a vida do bebê concebido em estupro é uma vida como qualquer outra. Então acha justo um garoto ter de ouvir, à chegada de certa idade, que foi concepção de uma violação contra a própria mãe? Acha que é justo a mãe ter de refazer planos de uma vida inteira por um crime que contra ela foi cometido?
Não sei se fui mais claro desta vez.
Foi muito claro sim. Discordando, não apoio o aborto totalmente legalizado em hipótese alguma. O fato de não ser corriqueiro anula a vida dos raros abortos feitos, caso não fosse necessária a doença como desculpa?
ExcluirExatamente! A vida é inerente aos direitos! Mas é justo matar quem não tem acesso a eles? Matar, quando a culpa é nossa? Alegando sofrimento futuro, quando hoje podemos notar pessoas ricas e com situação confortável entrando em depressão e suicidando? Também não é um martírio o que passamos? É como matar o pobre para que não haja mais pobreza e sofrimento, não? Porque não buscamos melhorar a vida deles, ao invés de ceifá-las? Discuto isso em relação ao aborto geral, e não especificamente de anencéfalos.
Não sou a favor de aborto em casos de estupros. Creio que a culpa em momento algum seja do feto. Acredito que a solução não é matar, mas sim melhorar o sistema de adoção, educação sexual, prevenção, e todas essas coisas que já conhecemos . A mãe não deve ser obrigada jamais a cuidar de uma criança! Não seria direito dela e do bebê uma oportunidade de escolha? Ter um local de acolhimento que não seja a cama hospitalar? Mas abortar é o caminho mais rápido, mais fácil para acabar com o sofrimento! E o melhor é que a vítima não pode contestar!
Já sobre o aborto de anencéfalos, ainda há questões que desconheço respostas, principalmente na área medicinal.
Obrigado pela atenção!
Sua colocação é bastante interessante e é uma opinião pertinente, devo dizer. Creio que o melhor caminho é o proposto pelo próprio texto do Marco, o de "judiciar" o aborto, torná-lo não legal, mas passível de análise judicial para que, consoante o caso, se faça a aprovação ou não do aborto. O debate que aqui se estabeleceu foi magnânimo, excepcional; gostaria que ocorresse em mais textos.
Excluirhaha a sun agradece sua paciência ^^
ExcluirNossa foi bem claro Ian, eu não deixaria um filho vim ao mundo sabendo que ele irá sofrer, e mais pra quem deseja ser mãe tem que ser responsavel não basta apenas querer afinal estamos falando de uma VIDA. Lu
ResponderExcluirSe essa for sua condição para dar vida a um ser humano, temo dizer-lhe que jamais poderá tornar-se gestante, pois o sofrimento já é algo atrelado a condição humana, totalmente inevitável.
ExcluirConcordo com você, vinnycius, mas creio que eu e você sabemos que o que ela quis dizer não foi bem no conceito existencialista do existir. é o sofrer no sentido de nascer em uma família sem estrutura, de não ter acesso à educação, saúde, estas coisas...
ExcluirOk, desculpem minha ignorância.
ExcluirÉ justamente isso Ian.
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